A carne dos países ricos tem um alto custo para os países
pobres.
A equação é simples : 1 hectare de terra pode alimentar 50
vegetarianos ou 2 carnívoros.
Produzir 1 kg de carne requer a mesma área de terra que o
cultivo de 200 kg de tomates ou 160 kg de batatas ou 80 kg de maçãs(12).
De acordo com outra estimativa, feita por Bruno Parmentier,
economista e ex-diretor da Escola Superior em Angers, na França, 1 hectare de
terra boa pode alimentar até 30 pessoas com legumes, frutas e cereais, mas se a
mesma área for dedicada à produção de ovos, leite ou carne será capaz de
alimentar não mais que 10 pessoas(13).
Para se conseguir 1 caloria de carne bovina na pecuária
intensiva são necessárias 8 a 26 calorias de alimento de origem vegetal que
poderiam ter sido consumidos de forma direta por seres humanos(14).
Com o plantio de aveia é possível obter 6 vezes mais
calorias por hectare do que se a mesma área for destinada à produção de carne
de porco, e 25 vezes mais do que o total de calorias obtido com a produção de
carne bovina. O rendimento, como se vê, é deplorável.
Não é de admirar que
Frances Moore Lappé tenha qualificado esse tipo de agricultura como “fábrica de
proteínas às avessas”(15).
A pecuária, como vimos, consome anualmente, 775 milhões de
toneladas de trigo e milho, o que seria suficiente para alimentar de modo adequado
a faixa do 1,4 bilhão de seres humanos mais pobres (16).
Em 1985, durante a crise de alimentos da Etiópia, enquanto a
população morria de fome o país manteve a exportação de cerais destinados ao
gado inglês(17).
Nos Estados Unidos, 70% dos cereais são destinados à
pecuária, enquanto na Índia essa porcentagem é de apenas 2%(18).
Comer carne é, portanto, um privilégio de país rico,
exercido em detrimento dos países pobres.
Nos últimos trinta anos, enquanto explodia o consumo de carne,
dobrava o número de pessoas subnutridas. De acordo com a FAO e a ONG
International Action Contre la Faim (Ação contra a Fome), hoje em dia mais de
900 milhões de pessoas sofrem de desnutrição, e uma criança morre de fome a
cada seis segundos, embora sejamos capazes de produzir, em escala mundial, as
calorias suficientes para alimentar o mundo inteiro(19).
Como explicou Jocelyne Porcher, diretora de pesquisas do
INRA e uma das principais especialistas no assunto: “Os sistemas industriais de
produção animal têm como único objetivo gerar lucro. Eles não têm outra meta.
Eles não têm como objetivo “alimentar o mundo”, ao contrário do que muitos
pecuaristas querem nos fazer crer. Todos nós sabemos muito bem que os setores
industriais incentivam nossos filhos, através da publicidade, a engolir
salsichas no lanchinho da tarde [...], mas não se interessam pelas 900 milhões
de pessoas subnutridas no mundo. O que interessa aos setores industriais é,
obviamente, o mundo ‘que pode pagar’(20).
Quanto mais as populações enriquecem, mais aumenta o consumo da carne (21).
Um francês ingere 85 kg de carne por ano e um americano 120
kg, contra apenas 2,5 kg de um indiano.
Em média, os países ricos consomem 10 vezes mais carne do que os países pobres (22).
O consumo mundial de carne quintuplicou entre 1950 e 2006,
uma taxa de crescimento duas vezes superior ao da população e, mantidas as
tendências atuais, esse consumo ainda irá dobrar até 2050(23).
Não obstante, já há algumas décadas, nos países ricos
diminui lentamente o consumo de carne vermelha, que adquire má reputação por
seus efeitos nocivos para a saúde, enquanto está em forte alta o consumo de
carne de aves.
Nos Estados Unidos, a quantidade anual de bovinos abatidos
em matadouros diminuiu 20% entre 1975 e 2009, enquanto o total de frangos
abatidos aumentou 200%(24).
A mesma
tendência é observada na França.
Em contraste, o consumo de carne triplicou em 40 anos nos
países em vias de desenvolvimento, e tem agora um crescimento espetacular na
China, em especial na classe média.
Existem hoje nas grandes cidades chinesas restaurantes que servem apenas
carne, e crianças que comem carne em cada refeição. Na China, ao longo dos últimos 20 anos, o consumo
de frango aumentou 500% e o de carne bovina, 600%(25).
A cada ano, um pouco mais de 1/3 da produção mundial de
cereais vai para a pecuária, e ¼ da produção mundial de peixes, transformados
em “farinha de peixe”, é reservado para a alimentação de bovinos, suínos e aves(26).
Como observado por Eric Lambin, professor nas universidades de
Lovaina, na Bélgica, e Stanford, nos Estados Unidos: “Essa concorrência entre o
homem e os animais no consumo de cereais acarreta um aumento de preço do
produto, o que traz consequências trágicas para as populações mais pobres(27).
É preciso levar em conta que as ¼ das 2,8 bilhões de pessoas
que vivem com menos de 2 dólares por dia dependem da pecuária para a sua
subsistência, e que a pecuária contribui de forma significativa para o
desenvolvimento econômico, mas isso não invalida o ponto de vista que acabamos
de expressar.
Não são esses pequenos operadores que contribuem para a
produção em massa de carne e, portanto, para os desvios na produção de carne:
isso é feito pelas grandes instalações quase industriais destinadas à pecuária
intensiva, bem como pelas monoculturas que alimentam essas grandes empresas (28).
No entanto, as pequenas propriedades das populações pobres
também estão envolvidas, embora de maneira mais limitada, com a degradação das
terras em que vivem.
Em longo prazo, sua subsistência seria mais bem assegurada
pelo desenvolvimento de métodos agroecológicos que garantissem a qualidade do
solo e da vegetação(29).
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Texto retirado do livro :
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Referências :
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