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Hino do Blog : " ...e todas as vozes da minha cabeça, agora ... juntas. Não pára não - até o chão - elas estão descontroladas..."
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Sunday, May 01, 2011

Bethania e as Palavras




















Não, não vou me posicionar contra ou a favor da Bethania estar autorizada pelo governo, através da lei Rouanet , a buscar na iniciativa privada os tais de 1,3 milhões de reais para montar um blog de poesia.

Sobre isto tenho minha opinião e prefiro não me manifestar. O que quero falar é sobre o encontro “Bethania e as palavras” que teve sua primeira edição aqui em Porto Alegre ontem à noite.

Dentro de um formato simples, enxuto, apenas com dois instrumentistas -excelentes é claro -, o espetáculo é um misto de música, poesia e textos de livros que de fazem parte do universo emocional e afetivo da diva.

E que universo !

Definitivamente não é sempre que vemos num mesmo espetáculo um desfile de imortais como Fernando Pessoa, Guimarães Rosa, Carlos Drumond de Andrade, Capinam,, Villa –Lobos, Ferreira Gullar, Amália Rodrigues, Manuel Bandeira, Chico, Caetano, Renato Teixeira, e tantos outros.

Dividido em “temas”, se é que se pode chamar assim, o ritual inicia com uma invocação a Iansã, deusa dos raios, ventos e tempestades. Com força e gentileza, a dona da casa nos convida a penetrar no mundo mágico das palavras, da escrita.

Genipapo Absoluto (Caetano), - juntamente com textos de Jorge de Lima, Guimarães Rosa e Antonio Vieira - vêm em seguida, no resgate afetivo e na afirmação da importância, poder e necessidade da poesia.

O sertanejo, - sua saga, sua história, suas dores, sofrimentos, afetos, valores, sua mitologia enfim - , é retratados em dois blocos distintos. Um mais, como dizer, “do interior” – com “Vou danado pra catende” (Ascenso Ferreira),” Trenzinho Caipira” (Villa-Lobos), “Trem de Ferro (Manual Bandeira), etc - e outro que mostra o sofrimento, o desalinho, o estranhamento do matuto obrigado a migrar para a grande cidade – com “Lamento Sertanejo” (Gil), Patativa do Assaré, Último pau de arara (J. Guimarães).

O incrível é que o link, a ponte entre estes dois blocos se dá com “Francisco, Francisco”, de Roberto Mendes e Capinam, e “Águas e Mágoas do Rio São Francisco” (do Drumond), o que dá o tom exato de uma das causas do padecer do sertão. Emocionante.

Mas como a poderosa acredita e sonha, o tema “sertão” se encerra de forma sublime e engraçada com “ABC do Sertão” (Luiz Gonzaga)

Depois de um brevíssimo intervalo instrumental – no qual ela não sai do palco - Bethania volta matadora.

Ai meu Jesus!

De uma tacada só ela, totalmente impiedosa – sem cuspe nem vaselina – vai de “Poema de um funcionário cansado” (Ramos Rosa), “Nenhuma saudade já me resta” (Fernando Pessoa), “Solidão” (citação da “Dança da Solidão” do Paulinho da Viola ) , Mestre, meu mestre querido (Pessoa), “Estranha forma de vida” (Amália Rodrigues”), “Velha Chácara” (Manuel Bandeira) e vários outros nesta linha “saudade”, “lembranças”, “desamor”, “desespero”, “cortar os pulsos”.

E o problema é que a bandida, a malvada, não facilita e mastiga, rumina cada palavra com o destemor exato para sangrá-las e atingir as alma dos incautos. Os blocos assassinos se encerram com uma das minhas poesias preferidas : “`Poema do Menino Jesus (Alberto Caeiro)”, que já vi ela interpretar outras vezes, sempre me fazendo debulhar em lágrimas - e ontem não foi diferente... Fazer o que ?? Fiasco puro. – Nada como a discrição da escuridão do teatro para restabelecer a make-up.

Logo surge a memória cristã em homenagem a Nossa Senhora, com as belíssima “Ladainha de Santo Amaro” (Mabel Veloso – irmã de Betha) e “Romaria” (Renato Teixeira).


Entrando no mundo dos amores, das paixões ( o que é a cara dela), somos brindados com Fausto Fawcet, Bruna Lombardi, “Meu Primeiro Amor” e principalmente com Guimarães Rosa - “Diadorim e Riobaldo”. Não é sempre que podemos estar diante de uma obra mastodônica como esta. Guimarães extrapola qualquer conceito de bom, ótimo ou excelente em arte. Guimarães é mais do que um “escritor”, um “autor”. É um artesão, um bruxo , um abençoado, que utilizou (reinventou) as palavras para interpretar, decodificar, explicitar a alma, o espírito e tudo o que representa, tudo o que significa ser humano. Soberbo, pra dizer o mínimo.


O negro e o Indio, as matas e o caipira “são lidos” através Craveirinha, Castro Alves, Joubert de Carvalho, Capinam e outros. Bethania brilha especialmente em “Os Sapos” (Manuel Bandeira) - engraçada e lírica ao “imitar as vozes” dos diferentes sapos.

Por fim, no estilo “sou brasileiro e me orgulho”, nosso país, suas origens portuguesas, e tudo o que representa nossa língua – nossa, nação, afirmação e realidade - encerra o espetáculo nas vozes de Moraes Moreira, Caetano, Vinicius e outros.


A diva é ovacionada – os da fila do gargarejo jogam pétalas de rosas a seus pés (quer coisa mais “deusa” ? )- , sai do palco e retorna para um bis improvisado (pelo menos foi o que ela representou) e acaba com o povo com “Mensagem” (Isaurinha Garcia) e “Todas as cartas de amor (Fernando Pessoa).

Depois disto ? ... Um jantar com vinho Cabernet...

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6 comments:

Anonymous said...

Maravilha! Bethânia é imperdível. Eu assisti no Rio.
Estou doida para que o site de Poesias venha logo.
Salve!
Adélia
Rio de Janeiro

Iuri said...

É guria. A deusa é deusa mesmo !

barroso said...

Antes de tudo...PARABÉNS PELO BLOG!!!! Enfim um blog que fala minha língua!!!!!
E quanto ao espetáculo com Bethânia (minha conterrãnea, pois sou baiano), somente posso dizer sem acanhamento que te invejo pela excelente e exclusiva oportunidade.
Bethãnia é o arauto de nossas particulares tormentas e deleite.Irretocável, visceral e absoluta.

Iuri said...

Oi, guri... Obrigado pela visita. Adorei o " arauto de nossas particulares tormentas e deleites" ... Concordo integralmente (de verdade )

Anonymous said...

Vi ( no sentido extremo do que esse verbo pode ver) o show aqui em Vitória. Em Bh, semanas depois em passeio, pena que já estava esgotado, pois veria mil vezes se conseguisse. Não tem ( trocadilho) palavras que, literalmente, expressem o que se vê, ouve e sente nesse show. Obrigada, Bethânia!
Parabéns por seu blog, amigo!
Jocemara-Vitória-ES

Iuri said...

Oi, Jocemara. Obrigado por postar. Semana que vem vou assistir a deusa novamente. Agora cantando Chico Buarque. A coisa promete !