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Wednesday, April 27, 2011

Livro Retrato de um Viciado Quando Jovem ( Bill Clegg)

Bill Clegg era um jovem e bem sucedido editor de livros em Nova York. Bem estabelecido, circulava nas nos melhores ambientes intelectuais e mantinha um relacionamento com Noah, um cineasta (na verdade um psedônimo do cineasta Ira Sachs).

Fora isto, Bill era um “drug addict” genérico; alcool, maconha, cocaina, faziam parte da sua dieta.

Aparentemente, de uma forma zoneada é claro, ele conseguia se equilibrar com estes aditivos, porém tudo muda quando ele adentra o nevoeiro do crack.

Daí para diante sua vida vira um espiral rumo à vala da escória, um mergulho no sangradouro do abate humano.

Bill é impiedoso consigo. Sua narrativa é crua, direta, totalmente despida de máscaras, de hipocrisias ou palavras mansas.

Acompanhamos sua trajetória desde uma infância problemática a um adulto perturbado, lado a lado com seus traumas, loucuras, delírios, paranóias. Vivemos com ele sua vertigem, suas obsessões, carências. Seguimos seu frenesi pela selva da alienação, da demência – Apavorados, para dizer o mínimo.

Particularmente fiquei impressionado com a descrição (primorosa) da sua primeira experiência com o crack.

Isto acontece num momento em que ele encontra um senhor de aparência respeitável na rua, que o convida a acompanhá-lo a um quarto de hotel (com segundas intenções é claro).

Lá, este senhor (Fitz) lhe oferece o crack.

Neste trecho, Bill descreve detalhadamente (na terceira pessoa) o que sentiu ao fumar a pedra pela primeira vez.

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“Fitz lhe entrega o cachimbo com cuidado e, enquanto tira um isqueiro do bolso, pede que coloque os lábios ali. O tubo de vidro é delicado e suas mãos estão tremendo. Ele tem mêdo de derramar o crack no chão , mas isso não acontece. Fitz acende o isqueiro e passa a chama na ponta do cachimbo. Ele inala devagar ao ver aquela substância branca fazer bolhinhas e estourar no calor da chama. Uma fumaça perolada vem descendo pelo cachimo e ele suga mais para trazê-la atá a boca. Fitz pede que ele vá com calma, e ele obedece. Logo seus pulmões estão cheios , e ele segura a fumaça como faz com a fumaça da maconha. Ele exala e imediatamente começa a tossir. Tem gosto de remédio, ou de desinfetante, mas também um toque adocicado, como o sabor da lima. A fumaça forma vagalhões no ar, passando por Fitz como um grande dragão abrindo as asas. Ele vê aquela nuvem se espalhar e formar anéis e sente a onda primeiro como uma vibração , depois como um terremoto. Um raio de energia renovada eletriza cada centímetro do seu corpo, e há um momento de esquecimento perfeito, quando ele está consciente de nada e de tudo ao mesmo tempo. Uma espécie de paz surge por trás de seus olhos. Espalha-se das têmporas para o peito, depois para as mãos, depois para todo o resto. É algo que bombardeia – algo cinético, sexual, eufórico – como um magnífico furacão girando na velocidade da luz. É a carícia mais terna que já sentiu, mas quando recua, torna-se o mais gelado dos toques. Ele sente falta dessa sensação antes mesmo de ela ir embora, e não apenas quer mais, como precisa de mais.”

A idéia da ...

“ ...carícia mais terna que já sentiu, mas quando recua, torna-se o mais gelado dos toques Ele sente falta dessa sensação antes mesmo de ela ir embora, e não apenas quer mais, como precisa de mais.”

... é uma descrição porrada do efeito imediato do crack na criatura.

Bem, dizem que para o crack não há recuperação. Conheço um caso de um carinha que ficou afastado da droga uns sete anos, e acabou recaíndo. Seria o caso do Bill Clegg ? Ao que tudo indica ele continua limpo.

De qualquer forma seu livro é ótimo

Cotação : ótimo

1 comment:

Anonymous said...

O livro é lindo e parabéns pela crítica. Muito bem escrita. Mas sim, existe recuperação para o crack. Conheço várias pessoas de Narcóticos Anônimos que estão limpas há anos, e algumas que morreram limpas. :)