O Sistema Opressor e o Equilíbrio de Poder
Uma das formas que o sistema opressor influencia nossas
relações é criando entre nós um desequilíbrio de poder quando somos integrantes
de diferentes grupos dentro de um sistema.
O sistema define a cada um de nós um papel (personagem), e a
um papel é permitido (definido) mais poder do que a outro.
O papel que interpretamos é definido pelo grupo social que
pertencemos – branco/preto, homem/mulher, veganos/não-veganos e assim por diante.
Se pertencemos ao grupo dominante, muitas vezes referenciado
como “maioria”, temos mais poder do que teríamos se pertencêssemos ao grupo não
dominante (ou minoritário).
Porém, é claro que pertencemos a vários grupos, e cada um
dos grupos afeta o montante de poder que temos em nossas relações.
Por exemplo, quanto você pertence a um grupo dominante e a
um grupo não dominante, e a pessoa com a qual você se relaciona também, o poder
se desequilibra um pouco.
Talvez, por exemplo, você
seja um homem (dominante) e também vegano (não-dominante), enquanto a pessoa de
sua relação é mulher (não-dominante) e não-vegana (dominante)
Mesmo assim, não significa que o poder estará perfeitamente
equilibrado pois alguns papéis nos dão mais poder que outros.
Gênero, por exemplo, tem muito mais influência na quantidade
de poder que podemos ter do que a ideologia vegana/não-vegana.
(Mas) Não é possível nem
necessário calcular a quantidade exata de poder que trazemos à nossas relações.
É suficiente
importante entender as bases das dinâmicas de poder nas nossas relações que são
oriundas dos papéis que nos foram definidos pelo sistema social.
Talvez a forma mais contundente que o sistema opressor
utiliza para causar problemas nas nossas relações seja distorcendo nossas
percepções da realidade.
Quanto mais poder temos no sistema, mais poder temos para
vermos nossa versão de realidade aceita e vista como verdadeira, mesmo que isto
contradiga a realidade objetiva e a verdade da experiência dos outros.
Nenhum de nós pediu tal poder, e a maioria de nem percebe
que o tem.
Mas mesmo assim ele afeta a todos nós, e, ao menos que
entendamos como é sua dinâmica, não conseguiremos enfraquecê-lo nas nossas
vidas e relações.
Narrativa e Sistema Opressor.
Nossa narrativa é a história que criamos baseadas nas nossas
crenças e percepções; é a nossa versão da realidade.
Narrativas podem ser o resultado de nossa experiência
pessoal ou da nossa condição social herdada da nossa sociedade.
Por exemplo, se temos uma história pessoal de traição nas
nossas relações, podemos ter uma narrativa de que as pessoas são falsas.
Se crescemos numa sociedade heterossexista, nossa narrativa
herdada será que a heterossexualidade é normal e natural e que outras
sexualidades não anormais e não naturais.
E, se crescemos numa sociedade de consumo de carne, nossa
narrativa herdada será que comer animais é natural e normal, e que não comer
animais é anormal e não natural .
Nem todas as narrativas são criadas iguais. Algumas
narrativas têm mais poder que outras, significando que possuem “mais peso” e
que, automaticamente, são vistas como mais verdadeiras – mesmo que não sejam
realmente válidas.
Estas narrativas são as narrativas dominantes, ou narrativas
sociais dominantes. São as narrativas das pessoas ou dos grupos sociais com
mais poder num sistema específico.
Narrativas sociais dominantes são narrativas da sociedade cujos
membros de todos os grupos – dominante e não dominantes – são ensinados a
aprender e acreditar.
Por exemplo, tanto os heterossexuais quando os
não-heterossexuais aprendem a acreditar na narrativa social dominante que a
heterossexualidade é natural e que as outras sexualidades são anormais e não
naturais; o que é uma das razões dos
altos índices de suicídios entre adolescentes gays e lesbicas.
E os não-veganos crescem aprendendo e acreditando que comer
animais é normal e natural (praticamente nunca somos encorajados a pensar de outra
forma).
Quando impomos nossa narrativa aos outros, estamos definindo
suas realidades e ditando o que é a verdade para eles – e as narrativas sociais
dominantes são aquelas impostas a todos.
Todos nós trazemos narrativas sociais dominantes de casa que
acabam influenciando nossos relacionamentos pessoais.
Como resultado, muitos veganos e não-veganos podem cair numa
batalha (entre eles) que tem muito menos a ver com a forma pessoal de ser de
cada um, do que com o grande sistema do qual fazem
parte.
Por exemplo, a narrativa social dominante que diz que comer
carne é necessário à saúde tem muito mais poder do que a narrativa vegana que
diz que comer carne não é necessária à saúde – mesmo que os dados não sustentem
a narrativa de consumo de carne.
Então, se um não-vegano e um vegano estão discutindo o
assunto, a experiencia e narrativa do não-vegano, apoiada pela maioria da
sociedade, é automaticamente vista como mais válida do que a experiência e a
narrativa do vegano.
Desta forma, debates ferozes podem surgir – não apenas sobre
os fatos mas também pelo sentimento dos veganos de que suas opiniões não têm
valor e pelo sentimento dos não-veganos surgido daquilo que eles entendem como “radicalização”
dos veganos.
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Texto extraído e traduzido por mim do livro
“Beyond Beliefs:
A Guide to Improving Relationships and Communication for Vegans, Vegetarians,
and Meat Eaters” da Melanie Joy
Texto original abaixo
Oppressive Systems and Power Imbalances
A key way in which oppressive systems influence
our relationships is by creating a power imbalance between us when we belong to
different groups within a system.
The system assigns us each a role, and one
role comes with more power than the other.
The role we play is determined by
the social group we belong to—white/non-white, male/female, veg/non-veg, and so
on.
If we belong to the dominant group, sometimes referred to as the
“majority,” we have more power than we do if we belong to the non-dominant, or
minority, group.
Of course, we belong to many groups, and each of our groups affects
the amount of power we have in our relationship.
For example, when you belong
to one dominant and one non-dominant group, and so does the person with whom
you’re relating, power balances out a bit.
Perhaps, for example, you are a male
(dominant) and also a vegan (non-dominant), while your partner is female
(non-dominant) and non-vegan (dominant). Still, this doesn’t mean the power
will be truly balanced, because some roles give us more power than others.
Gender, for example, has far more influence on how much power we have than does
veg/non-veg ideology. It’s neither necessary nor possible to calculate the
exact amount of power we bring to our relationships.
It’s simply important to
understand the basic power dynamics in relationships that come with the roles
assigned to us by social systems.
Perhaps the most important way in which
oppressive systems cause problems in our relationships is by distorting our
perceptions of reality.
When we have more power in the system, we have more
power to have our version of reality accepted and seen as true, even when it
contradicts objective truth or the truth of the other’s experience.
None of us
asked for this power, and most of us don’t realize we have it.
Nevertheless, it
affects all of us, and unless we understand some of these power dynamics, we
cannot loosen their grip on our lives and relationships.
Oppressive Systems and
Narratives
Our narrative is the story we create based on our beliefs and
perceptions; it is our version of reality.
Narratives can be the result of our
personal experience or of our social conditioning, inherited from our society.
For example, if we have a personal history of being betrayed in our
relationships, we may have a narrative that people cannot be trusted.
If we
grow up in a heterosexist society, our inherited narrative will be that
heterosexuality is normal and natural and that other sexualities are abnormal
and unnatural.
And if we grow up in a meat-eating society, our inherited
narrative is that eating animals is normal and natural and that not eating
animals is abnormal and unnatural.
Not all narratives are created equal. Some
narratives have more power than others, meaning they carry more weight and are
automatically seen as more believable—even if they are not actually more valid.
These narratives are dominant narratives, or dominant social narratives, the
narratives of the person or social group with more power in a closed system.
Dominant social narratives are society’s narratives, which members of all
groups—dominant and non-dominant—grow up learning and believing.
For example,
both heterosexuals and non-heterosexuals learn to believe the dominant social
narrative that heterosexuality is normal and natural and that other sexualities
are abnormal and unnatural, or deviant, which is one reason for the high rates
of suicide among gay and lesbian teenagers.
And non-vegans and vegans grow up
learning and believing that eating animals is normal and natural; we are
virtually never encouraged to think otherwise.
When we impose our narrative on
others, we are defining their reality, dictating what is true for them—and
dominant social narratives are those that are imposed on everyone. We all bring
dominant social narratives home with us, to influence our personal
relationships.
As a result, many vegans and non-vegans can become ensnared in a
struggle that has far less to do with their personal ways of being than with
the broader system of which they are a part.
For example, the dominant social
narrative that eating meat is necessary for health has more power than the
vegan narrative that eating meat is not necessary for health—even though the
data do not support the meat-eating narrative.
So if a non-vegan and a vegan
are discussing the issue, the non-vegan’s narrative and experience, supported
by the broader society, is automatically seen as more valid than the vegan´s
narrative and experience. Heated debates can break out – not only about the
facts but also about the vegan feeling like ther opinion isn´t being given
equal weight and the non-vegan feeling imp
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