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Hino do Blog : " ...e todas as vozes da minha cabeça, agora ... juntas. Não pára não - até o chão - elas estão descontroladas..."
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Thursday, June 07, 2012

MPB GLS - Parte 4

Documento sem título
MÚSICA POPULAR BRASILEIRA E OS GUEIS (gays)

Panorama Histórico – Social - Cantos e Representações

- Quarta Parte -

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Trabalho apresentado na conclusão do "CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM LITERATURA BRASILEIRA" da Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 2009.
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A publicação deste trabalho no Blog foi dividida em 5 partes
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Para acessar a Primeira Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Segunda Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Terceira Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Quinta Parte, tecle AQUI
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6 - Gueis  e sociedade – situação a partir dos 80´s
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6.1 - Condição Guei  atual – evolução e preconceito
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Com a desclassificação pela OMS (Organização Mundial de Saúde) do homossexualismo como uma “doença”, a sociedade viu-se cada vez mais frente a frente com a discussão das questões gueis, seu espaço, direitos, inserção, reconhecimento, cultura, voz, visibilidade, eco, afirmação, etc,  mesmo  de forma truncada -  com avanços, retrocessos e desvios.

De qualquer forma desde a década de 80 tais discussões vem num continuum político e social que resultou em vários direitos, os quais,  se não representam até hoje uma plena integridade cidadã   equiparada aos heteros,  definitivamente estão anos luz do sombrio quadro humano a que as bichas estavam sujeitas décadas atrás.

A inserção na mídia de massa (principalmente a televisão – ainda que com algumas restrições), contribuiu – e contribui - para a visibilidade e discussão da  questão  guei de forma cada vez mais abrangente e aberta.

Hoje grupos organizados praticamente existem em todas as capitais do Brasil. Grupos de militância, de apoio mútuo, grupos políticos, saúde, artes,etc.

O dia do Orgulho Gay é celebrado anualmente em várias cidades. Neste dia as bichas – e simpatizantes – saem  às ruas para expor e celebrar sua condição – definitivamente algo impensável há alguns anos.
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7 - MPB Guei – Rock, Folia e Sapataria
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7.1 - Rock  brazuca – da inocência à consciência
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Leo Jaime
No início dos 80´s ocorreu uma revolução na música nacional com rock invadindo a grande mídia. Dos artistas que surgiram neste boom, Léo Jaime foi um que entoou duas canções que abordavam o mundo gay – ou seus assuntos - num tom cômico..

Uma é Aids, composta dentro da inocência de quem ainda não sabia no que iria se tornar esta terrível praga mundial.

E, depois, no refrão que o povo pulava e cantava em coro : “Aids, não tente colocar band-aid..!!.”
Que soava assim : “Êidis, não tente colocar bandêidis !! (... e  a festa tava feita ! ...).

AIDS
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É a última moda que chegou de Nova York / E deve ser bom como tudo o que vem do norte / A sua mãe vai gostar / O seu pai vai achar moderno / É mais quente que o inferno / Essa onda é de morte / New wave, patins, lennon and tennis nike / Walk man, big mac, fender strato caster / Vai pegar, vai pintar até na novela das 8 / E você vai copiar, vai copiar, vai copiar / Aids, não tente colocar band-aids
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Clique abaixo para ouvir AIDS


Outra do Léo é Sônia (versão de Sunny), que diz em um certo trecho : “(...) você na frente e eu atrás / Atrás de mim um outro rapaz / Sonia, meu amor, que loucura..."
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Sônia
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Sônia / Não fica me excitando que eu tô de sunga / Sônia / Não arma a tenda agora nós já vamos embora / E vamos combinar a nossa festinha  / Essa noite você é minha  / Sônia, meu bem, tá todo mundo olhando / Sônia, sempre que eu te vejo eu não durmo  / Sônia, e é por você que eu me masturbo  / Pensando em você me vem a sensação  / Sem perceber eu tô com o "tal" na mão / Sônia, eu te adoro  / Sônia, chega mais aqui e fica bem juntinho  / Sônia, vamos nessa festa fazer um trenzinho  / Você na frente e eu atrás  / E atrás de mim um outro rapaz  / Sônia, que loucura! / Sônia, eu já deixei de ser aquele bom rapaz  / Sônia, você não imagina do que eu sou capaz / Dizem que eu sou um cara legal  / Eu transo cunnilingus e sexo anal / Sônia, vou cair de boca / Eu sempre estive à fim e você sabe disso / Eu só quero te comer, não quero compromisso / Sônia, meu amor, eu te amo
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Já Lulu Santos, com toda sua verve pop, perpetuou, em Toda Forma de Amor, a frase definitiva sobre o respeito universal - “...consideramos justa toda a forma de amor...”


Toda forma de amor
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Eu não pedi pra nascer/ Eu não nasci pra perder / Nem vou sobrar de vítima / Das circunstâncias / Eu tô plugado na vida/ Eu tô curando a ferida / Às vezes eu me sinto/ Uma bala perdida/ Você é bem como eu/ Conhece o que é ser assim / Só que dessa história/ Ninguém sabe o fim/ Você não leva pra casa /E só traz o que quer/ Eu sou teu homem /Você é minha mulher / E a gente vive junto / E a gente se dá bem / Não desejamos mal a quase ninguém / E a gente vai à luta /E conhece a dor / Consideramos justa toda forma de amor
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Renato Russo
Curiosamente dois maiores ícones gueis do rock brasuca, Cazuza e Renato Russo, não criaram músicas marcantes no assunto. Talvez o Renato tenha sido mais explícito com Meninos e meninas - “...e eu gosto de meninos e meninas / vai ver que é assim mesmo e vai ser assim pra sempre...” -.

Também  Renato, no momento da saída do armário, gravou o The Stonewall Celebration Concert, uma homenagem aos gueis que resistiram à invasão do Bar Stonewall no Greenwich Village (New York /Julho de 1969). Porém, infelizmente,  é um cd sem músicas nacionais.

Meninos e meninas
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Quero me encontrar, mas não sei onde estou / Vem comigo procurar algum lugar mais calmo / Longe dessa confusão e dessa gente que não se respeita / Tenho quase certeza que eu não sou daqui / Acho que gosto de São Paulo / Gosto de São João / Gosto de São Francisco e São Sebastião / E eu gosto de meninos e meninas / Vai ver que é assim mesmo e vai ser assim pra sempre / Vai ficando complicado e ao mesmo tempo diferente / Estou cansado de bater e ninguém abrir / Você me deixou sentindo tanto frio / Não sei mais o que dizer / Te fiz comida, velei teu sono / Fui teu amigo, te levei comigo / E me diz: pra mim o que é que ficou? / Me deixa ver como viver é bom / Não é a vida como está, e sim as coisas como são / Você não quis tentar me ajudar / Então, a culpa é de quem? A culpa é de quem? / Eu canto em português errado / Acho que o imperfeito não participa do passado / Troco as pessoas / Troco os pronomes / Preciso de oxigênio, preciso ter amigos / Preciso ter dinheiro, preciso de carinho / Acho que te amava, agora acho que te odeio / São tudo pequenas coisas e tudo deve passar / Acho que gosto de São Paulo / E gosto de São João / Gosto de São Francisco e São Sebastião / E eu gosto de meninos e meninas
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Cazuza
Cazuza escreveu em O tempo não pára uma frase contundente - “... te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro / transformam o país inteiro num puteiro / pois assim se ganha mais dinheiro...” -


Talvez este grito de revolta tenha sido a referência mais explícita à causa guei do poeta.


O tempo não para
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Disparo contra o sol / Sou forte, sou por acaso / Minha metralhadora cheia de mágoas / Eu sou um cara / Cansado de correr / Na direção contrária / Sem pódio de chegada ou beijo de namorada / Eu sou mais um cara / Mas se você achar / Que eu tô derrotado / Saiba que ainda estão rolando os dados / Porque o tempo, o tempo não para / Dias sim, dias não / Eu vou sobrevivendo sem um arranhão/ Da caridade de quem me detesta / A tua piscina tá cheia de ratos / Tuas ideias não correspondem aos fatos / O tempo não para / Eu vejo o futuro repetir o passado / Eu vejo um museu de grandes novidades / O tempo não para / Não para, não, não para / Eu não tenho data pra comemorar / Às vezes os meus dias são de par em par / Procurando agulha num palheiro / Nas noites de frio é melhor nem nascer / Nas de calor, se escolhe: é matar ou morrer / E assim nos tornamos brasileiros / Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro / Transformam o país inteiro num puteiro / Pois assim se ganha mais dinheiro / A tua piscina tá cheia de ratos / Tuas ideias não correspondem aos fatos / O tempo não para / Eu vejo o futuro repetir o passado / Eu vejo um museu de grandes novidades / O tempo não para / Não para, não, não para / Dias sim, dias não /  Eu vou sobrevivendo sem um arranhão / Da caridade de quem me detesta / A tua piscina tá cheia de ratos / Tuas ideias não correspondem aos fatos / O tempo não para / Eu vejo o futuro repetir o passado / Eu vejo um museu de grandes novidades / O tempo não para / Não para, não, não para

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7.2 - O Carnaval e as bichas

O carnaval é um dos elementos mais manifesto na cultura brasileira. Está na vitrine do estereótipo tupiniquim traduzindo um estado de espírito – um momento de euforia, de libertação, de alegria. É uma festa que está - de acordo com o clichê antropológico -  na “alma” do povo brasileiro, na sua “natureza”, na sua “identidade”.

 Para João Silvério Trevisan (2007, pág. 392), a celebração, é ..


(...) uma festa brasileira, em que o deboche explode e o corpo se expõe dadivosamente, propicia ampla comunicação ao aproximar diversidades, cultiva vários graus de paródia em seus disfarces, consagra a transgressão e proclama o império da ambigüidade. Enquanto projeto de fantasia a ser realizada, o carnaval acusa o triunfo da imaginação sobre o quotidiano,  mediante a inversão de normas (...) quando masculino e feminino se confundem (profusão de travestismo entre os homens).

Já para Don Kulick (2008, pág. 55), o Carnaval não assume todo esse folclore lhe atribuído..
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Um dos mitos brasileiros sobre o Carnaval – mito que é reiterado e perpetuado tanto em análises acadêmicas quanto no senso comum – afirma que a festa é uma espécie de inversão generalizada (um mundo de cabeça para baixo), quando tudo passa a valer, quando a confusão e ambigüidade viram objetos de celebração, e o desvio se torna regra (...) Ainda que essa representação possa capturar a experiência de um certo grupo de participantes do Carnaval – particularmente homens heterossexuais da classe média – alguns pesquisadores (...) vêm demonstrando (...), que as descrições esfuziantes do Carnaval, que tanto atraem os turistas e intelectuais, não refletem adequadamente a experiência de uma grande parte dos brasileiros (....)

Seja como for, é inegável que  o carnaval faz parte do imaginário do brasileiro, que durante seu acontecimento participa, acompanha, ignora ou foge da festa.

Joao Roberto Kelly
Durante  tal orgia,   os gueis – principalmente as travestis - são os elementos bizarros, os seres abissais-sociais, as monstruosidades  que têm o direito de vir à luz e mostrarem sua “alegria”  antes de voltarem para suas tocas. É o período onde eles são “aceitos” e  onde, infelizmente, cumprem o papel de  bobos da corte.  E nesta participação encontram marchinhas  onde  são os alvos (para o bem e para o mal) e que são cantadas jubilosamente a plenos pulmões (por eles e pelos “outros”)

João Roberto Kelly, contribui com duas pérolas neste sentido. Uma é a Cabeleira do Zezé, que não teve a intenção de composição, mas que acabou derivando para uma leitura guei. A “Cabeleira” fala de um homem cabeludo que desperta suspeitas de comportamento.


Olha a cabeleira do Zezé  / Será que ele é ? / Será que ele é ? / Será que ele é bossa nova?/ Será que ele é Maomé? / Parece que é transviado / Mas isso eu não sei se ele é / Corta o cabelo dele!


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A jogada guei  vem na resposta à pergunta “Será que ele é ?”, que o povo acabou por “complementar” com o grito de “Bicha !” – Isto sem falar que a palavra “transviado” permite a mudança imediata para “viado”.

Outra é Maria Sapatão, consagrada pelo apresentador Chacrinha, que representa as lésbicas


Maria Sapatão  / Sapatão, Sapatão / De dia é Maria / De noite é João / O sapatão está na moda / O mundo aplaudiu / É um barato / É um sucesso / Dentro e fora do Brasil


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Chacrinha





Chacrinha, aliás,  de forma correta, compôs e divulgou Bota a Camisinha, que alertava – e alerta – para a importância do sexo seguro.


Bota camisinha  / Bota meu amor  / Que hoje tá chovendo  / Não vai fazer calor / Bota a camisinha no pescoço  / Bota geral  / Não quero ver ninguém  / Sem camisinha  / Prá não se machucar  / No Carnaval.


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Talvez a primeira marchinha com conotação guei tenha sido Boi da Cara Preta  gravada por Jackson do Pandeiro em 1959.  No site Palavra Arte,  encontra-se a história desta música que conta como o jornalista Osório Manoel Peixoto da Silva, foi


[...] autor do “furo” (um passageiro do trem da Leopoldina, viajando de Vitória para o Rio comeu um filé de carne bovina e passou a falar fino e virou bicha, de onde a polêmica sobre engorda de boi com hormônio feminino) que originou muitas piadas de âmbito nacional e inspirou a marcha carnavalesca “Boi da Cara Preta” (http://www.palavrarte.com..., 2007)

Boi da cara preta


Olha o boi da cara preta / Olha o boi da cara preta / Coitado do Waldemar / Está dando o que falar /  Comeu carne de boi, falou fino / E deu até pra rebolar (...)


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Jackson do Pandeiro



É de Jackson do Pandeiro também  a autoria e gravação da divertida A mulher que virou homem, uma música surpreendente que apresenta o drama de um pobre coitado cuja esposa vira homem (de Joana à João).


A mulher que virou homem


Meu pai me disse: meu filho tá muito cedo / Eu tenho medo que você se case tão moço / Eu me casei e veja o resultado / Eu tô atolado até o pescoço / Minha mulher apesar de ter saúde  / Foi pra Hollywood, fez uma operação / Agora veio com uma nova bossa / Uma voz grossa que nem um trovão / Quando eu pergunto: o que é isso, Joana? / Ela responde: você se engana / Eu era a Joana antes da operação / Mas de hoje em diante meu nome é João / Não se confunda nem troque meu nome / Fale comigo de homem pra homem / Fique sabendo mais de uma vez / Que você me paga tudo que me fez / Agora eu ando todo encabulado / E essa mágoa é que me consome / Por onde eu passo todo mundo diz / Aquele é o marido da mulher que virou homem


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7.3 - Safo  (fanchonas, caminhoneiras, paraíbas, bolachas, sapas & sapatonas)

No time feminino, a MPB encontra exemplos de lésbicas assumidas, sejam compositoras e / ou cantoras que marcaram, ou marcam, sua obra cantando o amor sáfico e / ou homo.


Aracy de Almeida
Pode-se dizer que a primeira cantora assumida teria sido Aracy de Almeida (grande intérprete de Noel Rosa desde os anos 30). Nos anos 70, já no ostracismo musical, ela tinha “entregado pra Deus” e assumia sua condição de sapata publicamente.

Porém sua figura rabugenta e cômica, que a tv  mostrava como jurada em programas de calouro,  a associava mais a uma caricatura do que a um ícone guei relevante; tanto que as gerações que a conheceram como jurada surpreendiam-se com a informação de que aquela  divertida tia mal humorada era também cantora.


Angela Ro Ro
Talvez a  primeira compositora lésbica verdadeiramente assumida tenha sido Ângela Ro Ro.  Depois de um lançamento bombástico – na segunda metade da década de 70-, onde ela foi vendida pela mídia como uma transgressora dos bons costumes -  como uma ameaça aos lares, à família brasileira -, a compositora viu sua  obra eclipsar-se sob diversos escândalos públicos.


Nas suas composições não se encontram canções explicitamente lésbicas. De qualquer forma existe uma bela gravação de “Bárbara” na sua voz.



Cassia Eller
Já a cantora Cássia Eller, que nunca escondeu sua condição, gravou algumas canções para a comunidade. Em Eles ela manda o povo curtir e gozar, com todas as combinações de sexo possíveis. “Os meninos e as meninas / Os meninos e os meninos / As meninas e as meninas / Eles só querem é gozar / E que os deixem a sós..”

Eles
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Os meninos e as meninas / Os meninos e os meninos / As meninas e as meninas / Eles só querem é gozar / E que os deixem a sós / Eles só querem é gozar / E que os deixem á sós / Os meninos e as meninas / Os meninos e os meninos / As meninas e as meninas / Eles só querem é gozar / E que os deixem a sós / Eles só querem é gozar
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E a super explícita Rubens que conta, de forma bem humorada, o amor assustado entre dois homens, além de tocar no preconceito à Aids.


Rubens
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Eu nunca quis te dizer / Sempre te achei bacaninha / O tempo todo sonhando / A tua vida na minha / O teu rostinho bonito / O jeito diferentão / De olhar no olho da gente / E de criar confusão / O teu andar malandrinho / O meu cabelo em pé / O teu cheirinho gostoso / A minha vida de ré - é / Você me dando uma bola / E eu perdido na escola / Essa fissura no ar / Parece que eu vô correndo / Sem vontade de andar /  Quero te apertar / Quero te morder,me dá / Quero mas não /  Posso, não, porque: / Rubens!!Não dá! / A gente é homem / O povo vai estranhar  / Rubens!! Pára de rir, menino / Se a tua família descobre / Eles vão querer nos engolir  / A sociedade não gosta / O pessoal acha estranho / Nós dois brincando de médico / Nós dois com esse tamanho / E com essa nova doença / O mundo todo na crença / Que tudo isso vai parar /E a gente continuando / Deixando o mundo pensar  / Minha mãe teria um ataque / Teu pai,uma paralisia / Se por acaso soubessem / Que a gente transou um dia / Nossos amigos chorando, / A vizinhança falando, / O mundo todo em prece / E quando agente passeia, / Agente só esquece / Quero te apertar / Quero te morder,bicha / Só que eu sinto uma dúvida no ar: / Rubens!!Será que dá ? / A gente é homem / O povo vai estranhar (...) / Rubens!!Eu acho que dá pé...  /  Esse negócio de homem com homem, / Mulher com mulher

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Vange Leonel



Vange Leonel, outra fanchona assumida, compositora e escritora, alcançou grande sucesso nacional com a música Noite Preta, tema da novela Vamp, da rede Globo em 1991.



Dela é a música, Esse mundo, que retrata um certo sonho de congregação da comunidade guei. A canção inicia

Bem vindos, bem vindos aqui / O trem já vai partir / Desarmem suas tendas temos muito a descobrir / Não há um lugar no mundo onde não podemos ir...

E depois traz um certo sentimento utópico de unidade


Esse mundo vai nos ver brincar / Esse mundo vai nos ver sorrir /
Esse mundo vai nos ver cantar.


Esse mundo
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Bem vindos, bem vindos aqui, o trem já vai partir / Desarmem suas tendas temos muito a descobrir / Não há um lugar no mundo onde não podemos ir / Bem vindos, bem vindos aqui, o trem já vai partir / Peguem suas máscaras nós vamos por aí / Mostrar como somos comuns e como podemos nos divertir / Não vamos ter medo só porque podemos pintar o rosto / Esse mundo vai nos ver brincar / Esse mundo vai nos ver sorrir / Esse mundo vai nos ver cantar / Esse mundo vai ouvir dizer / Bem vindos, bem vindos aqui yeah yeah yeah yeah / Esqueçam suas mágoas tudo o que não vai servir / Não importa se somos poucos / E não precisamos mentir não / Esse mundo vai nos ver brincar / Esse mundo vai nos ver sorrir / Esse mundo vai nos ver cantar / Esse mundo vai ouvir dizer / Esse mundo vai nos ver brincar / Esse mundo vai nos ver sorrir / Esse mundo vai nos ver cantar / Esse mundo,esse mundo
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Clique abaixo para ouvir Esse mundo
 

Já em outra canção, Rabo de Sereia, ela é bem explícita
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Diga que me odeia, diga que me quer / Eu sou sua parceira, eu sou sua mulher / Chave de cadeia, buraco do ladrão / Rabo de sereia, juba de leão
Você incendeia o meu coração / Minha companheira, minha direção / Só de brincadeira, diz que não me quer / Larga de besteira, eu sou sua mulher [...]


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Laura Finochiaro



Com imagem de artista cult, Laura Finochiaro (compositora gaúcha radicada em São Paulo)  nunca atingiu o grande público e também não conseguiu grande penetração na comunidade guei. Porém é dela, em parceira com Glauco Mattoso e Beto Firmino, o Hino da Diversidade, uma bela canção sobre a celebração das diferenças que ela entoou na parada Gay de SP em 2000


Hino à diversidade


Abrace a diferença! / Viver é diferente!  / Se a gente diz que é gente [réplica:] Eu sou é quem eu sou!  / Não tem o que nos vença!  Não há o que nos vença! / A DIFERENÇA É VIVA! / VIVA A DIFERENÇA!
Qual é o plural de "ão"?  / É "ãos"! É "ães"! É "ões"!  / Plural de cidadão? / São muitas multidões! / Qual é o plural de "ona"?  /É dona! É mona! É   zona!  / Plural de cidadã?  / Colega! Amiga! Irmã! / Qual é o maior plural ? / É a singularidade! É a diversidade!  / A diferença é qual?  / Unidos na igualdade! Orgulho, liberdade!  / Abrace a diferença!  / Viver é diferente!  / Se a gente diz que é gente [réplica:] Eu sou é quem eu sou!  / Não tem o que nos vença! / Não há o que nos vença!  / A DIFERENÇA É VIVA!  / VIVA A DIFERENÇA



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8 - Identidade Guei
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8.1 - Grupos e sub-grupos
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Se buscarmos estudar “identidade” (seja em termos individuais ou grupais) estaremos entrando num mundo caótico, num espaço de intempéries e sem luz no fim do túnel. O assunto é polêmico, controverso, escorregadio.

A ambição de formatar totalmente o termo (em suas múltiplas possibilidades) começa em Hércules e termina em Sísifo.

Segundo, Bauman (2004, pág. 16)


As pessoas em busca de identidade se vêem invariavelmente diante da tarefa intimidadora de “alcançar o impossível”: essa expressão genérica implica, como se sabe, tarefas que não podem ser realizadas no “tempo real”, mas que serão presumivelmente  realizadas na plenitude do tempo – na infinitude...

Ou seja, a  idéia de “alcançar o impossível”, prevê um continuum de esforço fadado, de algum modo, ao fracasso. Não que este esforço – esta busca – não possa definir conjuntos de elementos  que caracterizem, em maior ou menor grau, uma “identidade” (única ou social), porém, nunca o quadro estará completo devido às diversas variáveis que influenciam a discussão.

No que se refere a uma “identidade guei” o quadro é o mesmo. De maneira alguma pode se afirmar que exista um conjunto identificável de atos, costumes,  modos, comportamentos, desejos, interesses, etc, que caracterizem os gueis como grupo em ação na sociedade.

Num sentido amplo, se quisermos forçar a barra, poderia se pensar em uma “identidade de idéias”, a qual, de alguma forma, aproximaria as pessoas fazendo com que se reconheçam mutuamente.
Bauman, (2004 – pág. 17) comentando o assunto, apresenta duas linhas de “formação” ou “manifestação” da identidade grupal (e sua problemática).


É comum afirmar que as “comunidades” (às quais as identidades se referem  como sendo as entidades que as definem) são  de dois tipos. Existem comunidades de vida e destino, cujos  membros (...) “vivem juntos numa ligação absoluta”, e outras que são “fundidas unicamente por idéias ou por uma variedade de princípios” (...) A questão da identidade  só surge com a exposição a “comunidades” da segunda categoria -  e apenas porque existe mais de uma idéia para evocar e manter unida a “ comunidade fundida por idéias” a que se é exposto em nosso mundo de diversidades e policultural. É porque existem  tantas dessas idéias e princípios em torno dos quais  se desenvolvem essas “comunidades de indivíduos que acreditam” que é preciso comparar, fazer escolhas, fazê-las repentinamente, reconsiderar escolhas já feitas em outras ocasiões, tentar conciliar demandas contraditórias e freqüentemente incompatíveis.

Ou seja, reafirma-se a impossibilidade de alcançar resultados claros, facilmente identificáveis e mensuráveis, quando se pensa identidades em grandes grupos.

Tirando alguns aspectos macros (identidade de nacionalidade, religião, preferências esportivas, etc), quando se pensa no mundo guei, o que pode se tatear na discussão é a formação, o encontro de pessoas em comunidades menores que, de alguma forma,  se identificam (se reconhecem) umas com as outras.

Numa pulverização de interesses / perfis surgem grupos  como as travestis (que buscam a aparência feminina modificando seus corpos, mas não realizam operação de mudança de sexo), as drags ( “drag” vem de “dragão. São basicamente transformistas que se vestem de mulher em determinadas ocasiões – muitas vezes para shows/performances-, mas que não procuram modificar seus corpos), as trans (as transexuais e / ou as “operadas” – aquelas que trocaram o pênis por uma vagina), as barbies (bichas saradas, bombadas, as de culto ao corpo), os ursos (bichas que cultuam homens gordos e peludos), os chubbies (gordos ou que cultuam os gordos, mas não necessariamente peludos), os chasers (que correm atrás dos gordos, peludos e preferencialmente mais velhos – os daddies -), as finas (as ricas, chiques e cultas), as pobres – ou pão com ovo (incultas e sem dinheiro), as tias (bichas velhas, toda bicha com mais de 30 já considerada velha -  também chamadas de Irenes), michês (garotos de aluguel, garotos de programa), as politizadas (que militam basicamente em partidos de esquerda), as religiosas (com suas comunidades cristãs, esotéricas, orientais ou batuqueiras), as punks, as góticas, as emos, as “normais” e por aí afora.

E dentro destes grupos existem sub-grupos; ou então uma criatura pode ser identificada em mais de um, como por exemplo uma bicha velha de corpo bom passa a ser uma Irene-Barbie, ou uma operada gorda é uma Trans-Chubbie,  um idoso que vende o corpo é Tio de Programa (sim, isto existe), entre outras “alternativas”.

Por incrível que pareça estes sub-gêneros de viados tem cada um a sua cultura, com seus códigos de linguagem, ação e comportamento bem definidos. E isto também pode manifestar-se em estilos (ou recados) musicais (que veremos adiante).
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8.2 - Poder e resistência  (sub-cultura e resposta)
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O desprestígio, a condenação, a zombaria, a perseguição, a violência -  e todos os elementos negativos históricos aos quais os gueis estão (e estiveram) expostos, contribuíram para que estes só pudessem (ou possam) encontrar ambiente para manifestação da sua “natureza” e /ou  emoções em espaços restritos (possíveis) – principalmente guetos e/ou comunidades.

Os “guetos” estão vinculados – principalmente – a casas noturnas, bares e outros estabelecimentos que tem como objetivo atender o público afim. As comunidades podem ser das mais variadas, como grupos de apoio mútuo, ongs, grupos religiosos, profissionais, artísticos, políticos, saúde, etc ou apenas grupos de amigos informais que se reúnem para confraternizar, trocar experiências, discutir banalidades, compartilhar sentimentos, emoções, etc.

Não importa a natureza da associação, estabelecimento ou proposta, a idéia é disponibilizar – ou encontrar, criar,  ocupar - espaços onde o guei possa sentir-se à vontade consigo mesmo e com os demais, onde o guei possa respirar tranqüilo.

Nestes ambientes nasce um conjunto de práticas, idéias, ações, códigos, interesses que definem uma “cultura” (ou sub-cultura) guei – um conjunto de referências que aproxima as pessoas (os marginalizados, os iguais) e excluem os não iniciados (aqueles que representam “o outro” – o peso do dedo social, que define, acusa, condena e executa).

A construção e a vivência desta “cultura” sempre ocorreu na história  e é uma resposta (mesmo que não totalmente conhecida pelos “outros”) às opressões – e pressões – (explicitas ou veladas) as quais os gueis estão expostos diariamente.

Em “A invenção do cotidiano – 1. A arte de fazer”, Michel de Certeau, trata da questão do “produto” que é gerado, pelos grupos sociais  a partir das “representações” a que eles estão expostos no seu dia a dia.  Tais “representações” são as manifestações (eventos, registros) sociais (mídia, educação, regras, deveres, direitos,  linguagem, mercado de consumo, espaços urbanos, cultura, técnicas, procedimentos, entendimentos, etc)  que são transferidas (de modo perceptível ou não) aos indivíduos na sua experiência do ocorrer diário.

Toda “representação” está vinculada a uma idéia de “poder”, ou seja, sua emissão, seu surgimento, sua aparência tem uma idéia de “verdade”, de “natural”, de “correta”, que deve ser aceita (conscientemente ou não), internalizada e vivenciada.

Porém Certeau registra que os “consumidores” – os alvos destas representações – não funcionam exatamente de acordo com as idéias propostas (ou impostas) e discute os processos de suas transfigurações, de suas subversões.


A "fabricação" que se quer detectar é uma produção, uma poética  -  mas escondida, porque ela se dissemina nas regiões definidas e ocupadas pelos sistemas da "produção" (televisiva, urbanística, comercial etc.) e porque a extensão sempre mais totalitária desses sistemas não deixa aos “consumidores” um lugar onde possam marcar o que fazem com os produtos. A uma produção racionalizada, expansionista além de centraliza­da, barulhenta e espetacular, corresponde outra produção, qualificada de "consumo" : esta é astuciosa, é dispersa, mas ao mesmo tempo ela se insinua ubiquamente, silenciosa e quase invisível, pois não se faz notar com produtos próprios mas nas maneiras de empregar os produtos impostos por uma ordem econômica dominante. (op.cit., pág. 39)

No caso dos gueis, pode-se dizer que as “representações” de poder a que estão expostos, mutam-se em códigos, comportamentos e linguagens que são interpretados e vivenciados dentro da “comunidade” de uma maneira totalmente diversa. Assim, com um caráter subversivo,  outros significados surgem, distantes (ou em paralelo) das intenções originais.

Certeau (2008) exemplifica este fenômeno :


Há bastante tempo que se tem estudado que equívoco rachava, por dentro, o "sucesso" dos colonizadores espanhóis entre as etnias indígenas: submetidos e mesmo consentindo na dominação, muitas vezes esses indígenas faziam das ações rituais, representações ou leis que lhes eram impostas outra coisa que não aquela que o conquistador julgava obter por elas. Os indígenas as subvertiam, não rejeitando-as diretamente ou modificando-as, mas pela sua maneira de usá-las para fins e em função de referências estranhas ao sistema do qual não podiam fugir.

Os agentes-alvo (os dominados) passam então, através de uma “resistência” velada, a retrabalhar a “dominação” (poder);  a resignificar e recriar as “representações” e, a partir disto, a  reocupar os espaços oficiais, agora sob uma nova ótica, uma nova proposta (as quais podem ser explícitas ou não – que podem ser de conhecimento dos agentes de poder ou não),  com novos códigos e novos produtos. 
Certeau (2008)  exemplifica este processo “marginal” falando da sabedoria da cultura popular (objeto de resistência contrário à assimilação)


Falando de modo mais geral, uma maneira de utilizar sistemas impostos constitui a resistência  à lei histórica de um estado de fato e a suas legitimações dogmáticas. Uma prática da ordem construída por outros redistribui-lhe o espaço. Ali ela cria ao menos um jogo,  por manobras entre forças desiguais e por referências utópicas. Aí se manifestaria a opacidade da cultura “popular” - a pedra negra que se opõe à assimilação. O que aí se chama sabedoria, define-se como trampolinagem, palavra que um jogo de palavras associa à acrobacia do saltimbanco e à sua arte de saltar no trampolim, e como trapaçaria, astúcia e  esperteza no modo de utilizar ou de driblar os termos dos contratos sociais.  Mil maneiras de jogar/desfazer o jogo do outro, ou seja, o espaço instituído por outros, caracterizam a atividade, sutil, tenaz, resistente, de grupos que, por não ter um próprio, devem desembaraçar-se em uma rede de forças e de representações estabelecidas. Tem que "fazer com". Nesses estratagemas de combatentes existe uma arte dos golpes, dos lances, um prazer em alterar as regras de espaço opressor.

Os gueis também são os saltimbancos que acabam por tirar proveito do “jogo legal” proposto, “pervertendo” as regras, redefinindo “leis” e preceitos, criando e ocupando espaços, gerando códigos, imagens, modos, comportamentos, linguagem,  etc. ou seja, “utilizando” a experiência do cotidiano para construir uma (sub) cultura de oposição.

No que se refere especificamente à “criação” de uma (sub)linguagem,  veremos elementos de como esta surge e como é empregada na canção.

8.3 - Linguagem guei (opressão e religião)

Como qualquer grupo humano, os gueis desenvolvem a utilizam códigos de comunicação próprios. Elementos como hábitos, comportamentos, experiências, vivências, interesses, desejos, emoções fazem parte do adubo que frutifica em uma (sub) cultura - meio marginal / meio oculta -  que identifica estes mesmos elementos sob uma nova linguagem (novos códigos, novas expressões).

Um grupo guei (ou não) iniciado nesta linguagem pode manter um diálogo completamente inteligível para um neófito. Muitas das palavras e expressões utilizadas não existem no léxico oficial – ou se existem, têm outra conotação -. Isto faz com que esta linguagem represente um diferencial, uma resistência frente ao “outro”.

No estudo “A língua como resistência: uma tentativa sociolingüística de compreensão das linguagens de negros e homossexuais no Brasil”, Astor Vieira Junior  registra que grande parte desta linguagem guei tem origem nos “falares dos negros africanos, trazidos como escravos para nosso país” . 
Esta linguagem, utilizada dentro de centros religiosos africanos (principalmente no candomblé) é um quadro vivo, uma herança  do inconformismo, da resistência dos povos escravos.


Como elemento de resistência cultural, a linguagem dos negros africanos atravessou séculos, e mesmo ágrafa resistiu e se manteve viva, ainda que transformada por conta dos anos e das interações com outras línguas, servindo de alicerce identitário, sobretudo em decorrência da religiosidade desses povos
(http://www.espacoacademico.com.br..., 2007)

O guei praticaria esta linguagem a partir da aproximação com a religião / cultura africana. E esta “identificação”, esta aproximação estaria ligada a dois elementos / motivos :

O primeiro seria pelo fato de que os


[...] negros e homossexuais, de certo modo, estão unidos através das mesmas forças de exclusão, preconceito e discriminação. Os primeiros, pela cor, pelo culto as suas “estranhas” divindades, os outros pela negação dos princípios da hetero-normatividade. Ambos pelas diferenças com o europeu-cristão-colonizador. Todos, marginais (http://www.espacoacademico.com.br..., 2007)

O segundo teria como base o caráter “integrador” das religiões africanas onde a natureza (em todas as suas manifestações) é elemento de devoção, respeito e celebração.

Neste sentido,


O culto religioso de exaltação à natureza, onde seres encantados (orixás) partilham da mesa com seus filhos, onde a sexualidade não constitui pecado, a ambigüidade sexual festejada através de santos, da possibilidade de receber divindades masculinas e/ou femininas independente do sexo, e, sobretudo, no entendimento festejado de que a orientação sexual não é um impeditivo nem razão discriminatória da vivência coletiva e do compartilhamento com o divino, vai constituir-se num grande atrativo para aqueles que, igual aos negros, foram vítimas de séculos de exclusão e intolerância. (http://www.espacoacademico.com.br..., 2007)

Assim, a religião africana representa um oásis onde as bichas podem exercer sua espiritualidade livre de julgamentos, e, de certo modo, sendo até “admiradas”.


No Norte e Nordeste do Brasil, os candomblés são vistos como ‘lugares de bicha’, e, de fato, grande número de pais e mães-de-santo são homossexuais, inclusive alguns dos mais famosos e bem sucedidos. Os candomblés não têm nenhum preconceito em relação a homossexualidade e não é raro que um rapaz ou uma menina que tenha dificuldades em casa por causa de constantes acusações de ‘maricas’ ou ‘sapatão’ encontre nessas comunidades religiosas um lugar onde serão aceitos. [...] O candomblé, então, oferece a possibilidade de um jovem rapaz ou menina transformar seu estigma social em vantagem. (http://www.espacoacademico.com.br..., 2007)

Nesta conjugação, nasce um dialeto todo característico que tanto é empregado nos terreiros africanos quanto nas comunidades homossexuais. É a linguagem Pajubá (ou bajubá), que teria origem Nagô e Ioruba e que foi introduzida no mundo guei pelas travestis.

Alguns exemplos deste léxico :

Adé: bicha

Adé Fontó: bicha enrustida

Afofi: pênis com mau cheiro

Ageum: comida

Alibã: policial

Amapô: Vagina, mulher

Aqüé: dinheiro

Ilê: casa

Matchi: pequeno

Neca: pênis

Ocó: homem

Odara: grande, bonito, cheio de vida

Otchin: bebida alcoólica , bêbado

Picumã: cabelo, peruca

Uó: tudo que é ruim. "É uó" começou como exclamação dos travestis no Rio na década de 80 e se instalou como frase obrigatória do vocabulário moderno.

Fonte: (http://mixbrasil.uol.com.br/id/nago.htm)

Obviamente o vocabulário guei não se limita ao Pajubá e muitas outras expressões, vinculadas a outras origens, fazem parte da comunicação homo.

De qualquer modo, para entender boa parte da música de bicha praticada hoje no Brasil, é imprescindível que o ouvinte conheça o Pajubá e demais elementos (palavras, frases, expressões) que compõem a linguagem guei – que é ampla e altamente mutável.

Atualmente, definitivamente longe da grande mídia brasileira -  no chamado “mundinho” - acontece todo um movimento musical criado e executados pelos iguais  (ou simpatizantes),  que procuram traduzir  sua(s) (sub) cultura(s) agregando códigos, falas, expressões, vocabulários, etc,  num caleidoscópico jogo de signos.

Obs : Nos títulos seguintes, toda a vez que surgir uma palavra ou expressão identificada com a linguagem guei (pajuba e “normal”),  as mesmas são acompanhadas de um  comentário ou explicação entre parênteses.

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Trabalho apresentado na conclusão do "CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM LITERATURA BRASILEIRA" da Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 2009.
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A publicação deste trabalho no Blog foi dividida em 5 partes
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Para acessar a Primeira Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Segunda Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Terceira Parte, tecle AQUI.
Para acessar a Quinta Parte, tecle AQUI
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