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Monday, November 13, 2017

Teatro - Bernarda



Qual a possibilidade de misturar uma peça clássica e fortemente simbólica de Federico Garcia Lorca ("A Casa de Bernarda Alba" escrita em 1936), com músicas POP interpretadas pela Madonna e mais referências à serpente do Paraíso dar certo?

Pouquíssima é claro.

E isto se confirma ao vermos a montagem de “Bernarda” que esteve em cartaz até ontem no Teatro Renascença.

Não sei de onde a diretora Graça Nunes tirou que criar um imbróglio destes resultaria num prato apetitoso. O que é uma pena realmente pois a montagem está coberta de méritos, porém todos desconectados uns dos outros.

Vejamos :

A trilha musical é praticamente toda em cima de músicas que Madonna gravou. Isto é curioso uma vez que nem todas músicas apresentadas são composições dela, o que levanta a questão : qual a intenção da diretora ao utilizar tanto canções da Madonna como intérprete, como em “Fever” e “Bedtime Story”, quanto como compositora, como em “Like a Prayer”? Por exemplo, ao ouvirmos “Bedtime Story” devemos fazer uma referência à Madonna ou à Bjork? E o patético é que quem não conhece as letras em inglês não consegue de modo algum conectá-las à ação e fica tipo “que cantora foda!” - a extraordinária Gabrielle Fleck cantando e arrasando em cena-, e a coisa fica por isto mesmo. Isto sem dizer que cada uma das intervenções musicais quebra completamente o ritmo, a emoção da peça, gerando repetidos buracos e novos recomeços que são verdadeiros pé no saco.

Já a inserção de textos referentes a tentação da cobra sobre Eva no paraíso também soa desconectada, apesar da beleza da coreografia e da performance da Angela Spiazzi. O texto dito por ela realmente é muito bom, mas não cria liga nem com a música pop da Madonna nem com o texto do Lorca, soando mais como uma espécie de apêndice cravejado de “sedução ao pecado”.

O texto original - ou as partes que vimos aqui, uma vez que “Bernarda” traz excertos do original – é defendido por um grupo de atrizes excelentes. Quer dizer, quase todo o grupo, pois a performance de Aline Vargas é lamentável, tadinha. Muito me surpreende que as limitações da moça não tenham sido tratadas durante os ensaios a fim de não expô-la ao constrangimento estilo “vergonha alheia”. Mas as demais estão ótimas, com destaque absoluto para Rosangela de Britto (Bernarda), Elaine Segura (Poncia), Roberta Pochmann (Martírio) e Martina Fensterseifer (Adela). Infelizmente, mesmo que o grupo de atrizes guerreiras lute para manter a dignidade do texto fenomenal de Lorca, ele é constantemente agredido pelas invencionices “madônicas” e “serpênticas” nele injetadas.

 Que m...

Enfim, com toda esta dinâmica “interpenetrada”, o que temos pela frente são três ações correndo em paralelo todo o tempo: a Madonna cantando, a Serpente “tentando” e a Bernarda causando, o que cria um estranhamento e afastamento totais diante da ação. Repito : o que é uma pena, pois cada um destes elementos funciona muito bem se desfrutados separados uns dos outros (isto sem falar da belíssima encenação).

Resumindo, o que temos em “Bernarda” é uma tentativa de “reforçar”, de “empoderar”, de ressignificar o que já era naturalmente poderoso.

Porém á verdade é que o resultado é apenas uma trip megalomaníaca, cheia de intenções “causadoras” que resultou linda, porém pífia.

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