Yossi & Jagger
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Ao fazermos isto – recomendo - não só vemos os atores realmente envelhecidos em dez anos, mas também testemunhamos a mudança radical em termos de produção, roteiro, e proposta. Mesmo que ambos os filmes tenham sido dirigidos pelo mesmo diretor (Eytan Fox), existem profundas diferenças entre eles, o que faz com que cada um funcione em seu próprio formato.
“Delicada atração” narra o romance entre o oficial Yossi (Ohad Knolle) e Lior Amichai (Yehuda Levi) – também chamado de Jagger por sua semelhança com o líder dos Rolling Stones - , seu subordinado. Junto com um grupo de soldados, eles fazem a vigilância de um trecho da fronteira entre Israel e Líbano. Obviamente, a relação é mantida em total segredo.
Porém Jagger é mais assumido (mas nem tanto) enquanto Yossi é muito mais reservado. Isto gera um certo conflito entre eles : Jagger quer revelar-se perante a família e quer que Yossi o apóie e o acompanhe nesta idéia. Jagger almeja, como ele mesmo diz, entrar com Yossi num hotel e pedir quarto para casal “com cama king size”.
Paralelamente Jagger envolve-se, a sua revelia, num triângulo amoroso com a belíssima soldado Yaeli (Aya Koren), que é apaixonada por ele à distância, e que por sua vez é alvo do amor de Ophir (Assi Cohen). Acreditando que Lior tem um romance com Yaeli, Ophir o intimida, mas a situação não evolui pois todos os homens são convocados para uma missão militar na fronteira do Líbano na qual Jagger é atingido.
Ao ter seu amado agonizando em seus braços, Yossi – sob o olhar incrédulo de Ophir – beija-o, declara seu amor emvoz alta voz, além de sua promessa de uma vida futura a dois (ou seja, quem afirmou que ia se assumir publicamente era o Jagger, mas quem o fez – sob a dor é verdade - foi o Yossi)
Depois, no velório de Lior (o que ocorre em Tel Aviv), Yossi é testemunha do depoimento da mãe (Varda) do amado (interpretada pela quase desconhecida Yael Pearl Becker), que diz que nunca chegou a conhecer o filho realmente, que ele tinha um mundo à parte no qual ela nunca conseguiu entra.
Ela lamenta que o filho nunca chegou a apresentar-lhe uma garota, uma namorada. Neste momento Ayelam sentada ao seu lado declara ela que o amava e que achava que ele a amava tambem, satisfazendo o coração materno.
Isto tudo ocorre sob o olhar triste de Yossi que não pode revelar a verdadeira paixão e natureza de Jagger.
Fim.
Yossi
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Já o segundo filme mostra Yossi dez anos após perder seu amor.
Muito afetado pelo passado, seu retrato atual é pintado com cores melancólicas de modo a reforçar uma imagem solitária e triste.
Ele agora é um médico totalmente work-aholic (inclusive dorme no trabalho), que mora em uma espelunca, é desleixado consigo mesmo (faz a linha ursinho que tem vergonha do próprio corpo ) e procura contatos ocasionais na internet.
Um dia, por pura casualidade, vê Varda, a mãe de Jagger, entrar no hospital para marcar um exame.
Yossi
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Depois disto, Yossi parte para uma jornada solitária rumo ao Egito (ele quer atingir a Peninsula do Sinai). Porém, no caminho já perto da fronteira, casualmente, entra em contato com um grupo de jovens soldados, que o levará, por instinto, a reformular seus planos e ficar na agradável Eilat.
Hospede no mesmo resort do grupo dos jovens, Yossi acaba aproximando-se do soldado Tom (Oz Zehavi), numa espécie de, digamos, “releitura moderna” de “Morte em Veneza” - que alías é mencionada explicitamente no filme- mas sem o mesmo trágico final.
Depois de alguns passos hesitantes de ambos os lados, o encontro de Yossi e Tom finalmente “acontece”, numa cena muito bonita, e o filme rapidamente resvala para o fim.
Tom & Yossi
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Agora vamos aos problemas :
Yossi, aos 33 anos, se sente velho, feio e ultrapassado. Isto não cola bem, e o personagem em muitos momentos tem que evidenciar seus dramas (das mais variadas formas) para tentar dar alguma credibilidade ao seu quadro da dor. É quase inacreditável que ele recuse um convite para uma rave comandada pelo Dj Tiesto, para, ao invés, assistir a um show de bossa nova, executado por uma versão hebraica da Nara Leão (com direito a banquinho e violão e tudo). A garota (Karen Ann) canta tri bem, mas deixar de ir a uma rave bombada, com um bando de jovens soldados, para encarar um show intimista de bossa nova (aos 33 anos!), é forçar um pouco a barra.
A aproximação do Yossi com o jovem Tom pretende ser “delicada”, mas o lance soa muito superficial, com nenhum dos dois realmente “chutando (ou chupando?) o pau da barraca”. A jogada toda acontece entre “sensíveis” demonstrações de afeto e alguns mal-entendidos que criam um certo interesse. Mas tudo é executado de modo frouxo e inconvincente, o que não dá calor e veracidade ao idílio dos mancebos.
Para completar, o final é incoerente e fora da casinha. Tudo rapidamente fica muito cor de rosa, tudo muito Mundo de Barbie.
Se realmente aquele foi o desejo do Yossi, que personagem equivocado e medroso.
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Análise de Yossi & Jagger
Segue abaixo uma profunda e esclarecedora análise do filme Yossi and Jagger, retirada do livro “Soldiers, Rebels and Drifters : Gay representation in Israeli Cinema” (Soldados, Rebeldes e Perdidos – Representação Gay no Cinema Israelense) do Nir Cohen, não lançado no Brasil.
O autor inicia um análise dos filmes de Eytan Fox :
O primeiro curta de Fox “Time Off”, foi produzido quando ele era ainda um estudante do Departamento de Cinema e Televisão da Universidade de Tel Aviv. Desde então, Fox se tornou um dos diretores mais bem-sucedidos (pelo menos comercialmente) em Israel. O cineasta já dirigiu dois filmes para televisão - Baal Baal Lev (1997) e Yossi e Jagger (2002) - três longas para o cinema - Song of the Siren (1994), Walk on Water (2004) e The Bubble (2006) - e duas séries dramáticas para a televisão - Florentine (1997) e Mary Lou (2009).
Todos seus curtas, bem como Florentine, Mary Lou, and The Bubble lidam explicitamente com a realidade gay em Israel. Três deles - Baal Baal, Walk on Water e The Bubble - foram escritos por seu parceiro, o jornalista Gal Uchovsky
No entanto, conforme afirmo, a realidade que Fox retrata em seus filmes e séries de TV é baseada em um patriarcal, e as vezes até mesmo homofóbico, ponto de vista sobre a vida gay.
Seus filmes constantemente marginalizam ou excluem certos subgrupos dentro da grande comunidade gay. Esta abordagem contraditória pode ser vista como uma conseqüência da rápida mobilidade social que alguns homens gays têm desfrutado desde o início de 1990, o que enfraqueceu o espírito militante da década de 1980 (capturado nos filmes de Amos Guttman e em Crows de Ayelet Menahemi) . Resumindo : uma vez que algumas batalhas básicas foram ganhas e o status dos gays urbanos melhorou, a urgência em continuar a luta diminuiu.
Yossi & Jagger
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Em seus filmes, Fox retrata a identidade gay como parte inseparável da vida israelense : seus personagens servem ao exército (geralmente em prestigiosas unidades de combate), sentem uma forte ligação com a terra natal, e são o futuro Ashkenazi (explicação : homem branco da classe média) da sociedade israelense.
Sua ubiquidade e "normalidade" no entanto, põe em risco seu status como um grupo distinto, com características únicas e algumas conquistas ainda não alcançadas. A observação de Leo Bersani, de que "os gays têm se “desgayficado“ no próprio processo de fazerem-se visíveis", facilmente se aplica às idéias de Fox. Seus filmes são geralmente habitados por gays que vivem em harmonia com os seus homólogos heterossexuais, servem ao exército, e desfrutam de relacionamentos estáveis.
Por outro lado, em seus filmes Fox não foge da problemática realidade de Israel. Pelo contrário, ele utiliza alguns dos eventos mais traumáticos da história recente do país como pano de fundo para as histórias pessoais de seus personagens.
Em Time Off it é a Guerra do Líbano (1982); em Song of the Siren é a primeira Guerra do Golfo e os ataques dos mísseis Scud contra Israel (1991); em Florentine é o assassinato do primeiro ministro Yitzhak Rabin (1995), em Yossi and Jagger a consequência fatal da invasão do Líbano, que determina uma missão de tocaia para a qual os soldados são enviados (destinada a impedir que os terroristas entrem em Israel), termina com a morte de um dos protagonistas; e em The Bubble é a crescente ameaça de ataques terroristas em Israel desde os anos 1990.
Yossi & Jagger
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Em Time Off esse engajamento é bem ilustrado na demonstração do movimento Paz Agora, e nos debates que os soldados têm em seu caminho para o campo de batalha. Embora a ação de Yossi e Jagger aconteça quase duas décadas após Time Off , quando as consequências da guerra no Líbano já foram já amplamente conhecidas e criticadas, surpreendentemente o filme ignora o conflito. Essa diferença diz muito sobre mudança de posição de Fox, que sai de um ponto de vista crítico para uma postura mais apaziguadora.
Time Off e Florentine:: Borrando (misturando ) a Divisão Nacional / Pessoal
Time off
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Time Off, por exemplo, segue um pelotão de soldados israelenses enquanto seus integrantes passam do treinamento básico para a frente de guerra no Líbano em 1982. O enredo gira em torno de um breve momento na vida de um recruta. Parando em Jerusalém, onde todos ganham uma licença, Jonathan (Enoque Re'im), o protagonista, vaga sem rumo na cidade até parar em um parque, onde - na cena do banheiro publico -, a auto-censura, não só separa o visível do invisível, mas também o aceitável do tabu.
Aqui, o desenquadramento do ato sexual pode ser considerado uma analogia conceitual para um guarda patrulhando a fronteira (metafórica) entre a civilização e a barbárie, rigorosamente regulando sua permeabilidade, ardentemente detendo a maré desregrada de eros em nome de curso das civilizações : Só o que passa (é identificado) por "progresso” pode ”atravessar"
A fronteira "metafórica" que Roy Grundmann menciona em relação a Blow Job (explicação : Blow Job é um filme de Wandy Wharol que resume-se a uma lonta tomada silenciosa de chupada, onde a camera se concentra apenas no rosto do "protagonista". Grundmann escreveu um livro a respeito do filme ) torna-se uma fronteira real em Yossi e Jagger. Neste, o ato sexual também ocorre fora de quadro, bem como da fronteira do Estado de Israel. A área onde eles fazem amor é o lugar do não-civilizado, com um coelho que os dois amantes vêem como um símbolo da natureza selvagem e os terroristas escondidos (que não são vistos no filme, e dos quais o espectador torna-se consciente através dos acontecimentos subsequentes) como um símbolo da barbárie.
Yossi & Jagger
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Esta divisao reflete a adoção de um modelo linear e genérico da formação da identidade sexual - o que não pode acomodar a natureza dinâmica e fluida da sexualidade que a política homo pretende explorar - , bem como é fortemente baseada no heterocentrado olhar sobre a condição gay.
Jagger é a "femme", Yossi é o "butch", na tradição do gay macho "clone" look ", dos 1970´s, quando os homens gays, confome Richard Dyer argumentou, "já não se viam como intrinsicamente diferentes de seus objetos de desejo, mas sim, transformaram-se em tais objetos de desejo".
Aderindo a este retrato, os cineastas reafirmam a declaração de Dyer, de que "é praticamente impossível viver, imaginar ou representar a sexualidade entre homens gays, se não tiver em mente a diferença entre homens e mulheres".
A explícita divisão de papéis entre os dois - Yossi, o comandante musculoso e racional, versus Jagger, seu efeminado, sensível e irracional vice - é meticulosamente construída ao longo do filme. A cena de neve implica a definição dos papéis sexuais dos protagonistas embora esteja longe de ser explícita. Ao contrário da cena de sexo em Gotta Have Heart,, ela não mostra a relação em si.
Ao mesmo tempo, como a cena de Gotta Have Heart, a cena de neve delineia o equilíbrio de poder entre os dois protagonistas : Yossi é o “top”, o amante ativo, enquanto Jagger é o" bottom”, o passivo, tradicionalmente identificado com conotações de feminilidade e impotência.
A divisão clara é agravada por Jagger, que, enquanto está sob o corpo de Yossi, pergunta ironicamente : "Isto é um estupro, senhor?" O olhar do espectador, então, é mediado através do olhar de Yossi, que simboliza o poder que ele exerce sobre o parceiro.
Yossi sabe, no entanto, que vai perder seu status no exército caso venha a se assumir. Seu poder como comandante é concedido enquanto ele puder continuar a fingir ser alguém que não é. Ele troca o seu eu verdadeiro pela sua posição militar.
Yossi & Jagger
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Na sua análise da Querelle (1982), de Rainer Werner Fassbinder , Richard Dyer discute a marcação dos personagens do filme "em termos de masculinidade / feminilidade, acima de tudo, através da equação fodedor = macho, fodido = fêmea”. De acordo com Dyer, "É no ato sexual que as realidades sociais do poder do sexo - de gênero, do status heterossexual – entram no desejo gay".
Conforme dito acima, a relação sexual gay não está presente em Yossi e Jagger, mas a divisão estrita que Dyer descreve é refletida na cena em que Yossi está fisicamente sobre Jagger, abrindo seu casaco para descobrir que ele não está usando seu uniforme, e dizendo-lhe que ele (Yossi) geralmente coloca seus homens na cadeia por menos que isso.
Mesmo que essa observação seja dita despreocupadamente, pouco antes deles começarem a se beijar, ela vem como uma afirmação de caráter autoritário e masculino de Yossi em comparação com o Jagger “feminina” que está ao seu dispor.
Ambas posições servem como estereótipos definidos por normas heterosociais, menosprezando os esforços para ampliar o conceito de "homossexualidade", e sexualidade em geral.
Yossi & Jagger
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Em comparação, o apelido de Lior (“Jagger”), um nome não-israelenses, refere-se a persona sexualmente ambígua de Mick Jagger. Na superfície, o personagem de Yossi é a manifestação do judeu musculoso e ideal imaginado pelo sionista Max Nordau e imaginado cinematograficamente como um elo em uma longa cadeia de personagens que transmitem, nas palavras de Yosefa Loshitzky " uma poderosa e erotizada contra-imagem para o judeu da diáspora ". Seu personagem encarna a eterna ligação do guerreiro, muscular, judeu e heterossexual com sua terra ancestral.
Por outro lado, Jagger é apresentado como alguém irracional e impulsivo, o qual, ao insistir em se assumir e, portanto, colocando suas próprias necessidades e ambições acima dos interesses do Estado, viola a balança normativa do poder heterossexista
Os modos e a beleza de Jagger (um dos soldados lhe diz: "Você é linda como uma menina") sugerem que ele é mais estereotipadamente gay do que Yossi e, desta forma, contribui para a leitura de seu corpo como “feminino” - um resultado de uma ideologia que, nas palavras de Lee Edel "ao longo do século XX, tem insistido na necessidade da" leitura "do corpo como um meio de identificar a orientação sexual”
A rotulação do corpo de Jagger como "diferente" é o resultado da "homofóbica insistência da sociedade em codificar e registrar as identidades sexuais" (Edelman, Homographesis). Mesmo que não necessariamente haja suspeita que ele seja gay (ele não é humilhado por seus colegas soldados, mas isto pode ser fruto de sua posição mais elevada que impede os outros de questionar sua sexualidade em público), Jagger é percebido como o "outro" desde o início, e sua “diferença” acabará por levá-lo à morte.
Yossi age de forma a não ser rotulado. Ele mascara sua homossexualidade e se torna seu próprio opressor. Isso é ilustrado na cena em que ele escurece o rosto, camuflando-se, antes de sair para a emboscada. Enquanto ele examina seu reflexo em um espelho quebrado (um símbolo de sua homossexualidade fragmentada), ele acrescenta mais pintura de camuflagem, embora seu rosto já esteja completamente enegrecido.
O uniforme e os rituais que geram o ethos militar como a melhor mistura do caldeirão,- que dilui as diferenças raciais, socioeconômicas, ou educacional entre os soldados- , também são um dispositivo para diluir sua homossexualidade e produzir "uma superfície perfeita de masculinidade convencional"
Yossi & Jagger
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O medo de ser rotulado leva Yossi a rebaixar sua homossexualidade ao ponto da invisibilidade e até do absurdo : Yossi, cujo segredo é conhecido apenas por seu amante, é ameaçado até mesmo pela presença de um coelho que está olhando para ele e Jagger. O coelho simboliza tanto a covardia (a palavra hebraica para "coelho", shafan, também significa "covarde") quanto a sexualidade desenfreada, o que revela o conflito interno de Yossi entre sua natureza e o medo em aceitá-la completamente.
Os traços masculinos de Yossi, em oposição a "feminilidade" de Jagger, se manifestam principalmente quando Jagger insiste para que eles se assumam juntos.. Esta opção é inaceitável para Yossi, que quer seguir a carreira militar. Sua determinada recusa sugere que o amor gay é um ato irresponsável que pode comprometer sua carreira.
Yossi e Jagger
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Ao exigir que eles se assumam, e que depois comemorem em um quarto de hotel com uma "cama queen-size", Jagger estabelece o espaço doméstico-familiar, estereotipadamente relacionado à feminilidade e, portanto, “bicha”, que está em contraste com o espaço militar-masculino que Yossi ocupa - um espaço que não pode acomodar sua sexualidade não-normativa.
Assim Yossi diz a Jagger que podem continuar em seus termos, ou seja, de forma discreta, ou então separarem-se : "Eu sinto muito não surpreendê-lo com uma aliança, este não é um filme americano", diz ele. Sua homossexualidade é um sonho ou uma fantasia, e exatamente como um filme de Hollywood, difere da realidade.
Os dois amantes estão conscientes da divisão de papéis entre eles, e eles se referem a isto durante todo o filme. Enquanto estão deitados na neve, Jagger começa a cantar acompanhando sua música favorita, que toca em seu rádio portátil . A canção "Your Soul" é cantada por Rita, cuja dramática música pop e ultra-feminina aparência fez dela uma das cantoras mais bem sucedidas em Israel e um ícone gay.
Yossi e Jagger
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Conforme o espectador espera, Yossi não compartilha o amor de seu parceiro por Rita : "Seu gosto musical é tão gay", diz ele. Jagger então o acusa de preferir Meir Ariel ao invés de Rita. Ariel, um antigo cantor israelense, era um arquétipo do Sabra (termo utilizado para os nascidos em Israel), que fez comentários depreciativos sobre os homossexuais em uma entrevista em setembro de 1998.
A conexão entre Yossi e o homofóbico Ariel enfatiza seu auto-ódio. A letra da canção de Rita ressalta sua conotação gay quando Jagger a canta, pois são dirigidas a um homem (em hebraico, ao contrário do Inglês, o gênero é explicitamente marcado).
Cantando-a para Yossi, Jagger revela como ele vê seu amante. A letra (de Miri Feigenboim) descreve uma vida de mentiras como uma experiência escura e solitária, e incentiva o destinatário na canção a buscar sua própria verdade pessoal :
Vamos dissipar a cortina de nevoeiro
Vamos ficar na luz, e não na sombra
Até quando você vai continuar a correr?
Para os jogos de poder.
Você pode chorar, às vezes,
Quando você machuca seu coração
Conte-me sobre seus momentos de medo;
É mais fácil ter medo juntos.
Quando os ventos frios soprarem na tempestade,
Vou mandar o fogo preenchê-lo.
Um dia você pode parar de correr
Entre as sombras
Da sua alma.
Eytan Fox |
É importante observar que , em todos os filmes de Fox, o uso da música é fundamental. As vozes das cantoras, a pop music da Eurovision e as canções folclóricas israelenses, todas possuem um significado especial no cinema de Fox. Para ele a música é o "excesso" que o exuberante Technicolor e mise-en-scène do melodrama eram para Douglas Sirk, ou seja, uma ferramenta para informar que o filme está indo além das estruturas narrativas dominantes.
Embora a maioria dos filmes de Fox apresentem temas homossexuais explícitos, eles muitas vezes alinham-se com ideologias hegemônicas. O uso da música é um ato de subversão que lhe permite sugerir uma realidade diferente.
Em sua análise de Time Off, Raz Yosef explora o modo como a experiência gay, ou seja, a relação entre o soldado e seu comandante, é negada no nível visual, mas em seguida, é percebida e reconfirmada no nível sonoro.
De acordo com Yosef, a música em Time Off "torna-se um instrumento através do qual os dois homens, separados por fileiras e ideais sionistas de masculinidade heterossexual Sabra, subvertem as leis opressivas, militares e fálicas, e expressam a identificação queer"
Em um lugar onde a imagem visual do "outro" é distorcida, a voz serve como uma alternativa em potencial. De acordo com Yosef, o entendimento de Fox sobre as limitações da estrutura cinematográfica para o discussão dos temas gays dentro da ideologia patriarcal do cinema popular, levou-o a fazer uso da dimensão aural / sonora.
Eu diria que o uso de Fox da trilha sonora, muitas vezes mostra um compromisso variando entre seu desejo de agradar a um público amplo e não gay e seu desejo de construir uma subjetividade gay na tela.
A cena da morte
Yossi & jagger – Cena da morte
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Nesse momento, enquanto espera por socorro, ele diz coisas a Jagger que nunca ousou dizer antes. Ele declara seu amor não-condicional, nem um pouco incomodado com a presença de outro oficial, que pela primeira vez percebe que os dois militares são amantes.
Esta auto-realização segue um padrão universal prevalente em narrativas gays, nas quais, nas palavras de David M. Halperin, "O amigo mais fraco ou menos favorecidas morre. [...] A morte é o clímax da amizade [... ] e os casa para sempre (na memória do sobrevivente, pelo menos). [...] Morte é para amizade o que o casamento é para o romance "
Thomas Waugh reforça a reivindicação de Halperin, argumentando que a morte é um dispositivo narrativo utilizado para garantir que o romance gay não vai durar: "Os protagonistas desta alternativa gay de estrutura da unidade conjugal, ao contrário de suas contrapartes heteros, raramente acabam juntos”
Eytan Fox |
Na morte do amante é que Yossi adota, pela primeira vez, alguns dos comportamentos "irresponsáveis" de Jagger, e assim ele quebra a barreira entre o público e o privado, o doméstico e o militarista, enquanto corre para o lado de Jagger não como comandante mas sim como seu parceiro enlutado.
Este gesto pode ser lido como irracional e emocional e, portanto, uma reação feminina, em desacordo com o que o espectador aprendeu a esperar de Yossi. Infelizmente, este momento de auto-realização só pode ser experimentado na morte Jagger.
No entanto, é importante notar que o filme define uma identidade gay, não tanto por retratar a homossexualidade como natural e neutra, mas sim por denunciar o namoro e o relacionamentos heterossexual como cínico e abusivo, empregando os mesmos argumentos geralmente usados contra os homens gays.
Os dois amantes gays no filme são, ironicamente, mostrados mais comprometidos do que seus colegas soldados. Goldie (Hani Furstenberg), um dos soldados do sexo feminino, substitui intimidade com sexo abusivo - como mostrado na sua definida relação sexual de poder com o coronel casado (sua declarada recusa a comprometer-se em uma relação "Eu estou aqui para me divertir, não para casar "- é provavelmente mais uma proteção contra a dor do que um sinal de libertação).
Yaeli (Aya Steinovitz), o outro soldado do sexo feminino, não pode ter o seu objeto de amor. Sendo desesperadamente apaixonado por Jagger, ela permanece cega para o fato de que ele é gay. Como os demais, ela pode ler os sinais, descrevendo-o como "gentil" e "diferente de todos os outros homens", porém não consegue interpretá-los.
Como um casal gay, Yossi e Jagger se ajustam ao modelo heteronormativo, e eles conseguem fazê-lo mais do que seus colegas heterossexuais. Estes últimos são convencionalmente estereotipados : o coronel abusa do seu poder, e os soldados femininos ou são prostitutas ou são virgens. Assim, tornam-se uma representação grotesca das normas machistas chauvinistas.
Invertendo a norma de filmes de Hollywood, são os personagens heteros em Yossi e Jagger que iluminam os protagonistas gays e são usados como uma reflexão crítica da moral militarista heterossexual.
Sendo o maior alvo dos terroristas, , o coronel não apenas trai sua mulher com um de seus soldados, mas também abusa de seu poder a fim de fazê-lo. Em um momento do filme ele ordena sua parceira sexual a tirar seu "traseiro gordo do carro."
O coronel se refere ao aviso sobre o próxima emboscada como uma boa notícia, sublinhando o quanto ele gosta "da ação e do cheiro de carne queimada no período da manhã", embora ele não vá estar com os soldados para sentir o cheiro da carne queimada na manhã seguinte.
Eytan Fox & Ohad Knoller
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Quando Yossi tenta mudar a decisão do coronel, este o acusa de se tornar um "homo", um "maricas" e de se preocupar com seus soldados como se fosse sua mãe (assim, estereotipadamente associa homossexualidade com covardia e maternidade, e daí com feminilidade) . Em sua reação às preocupações justificadas de Yossi, o coronel revela não apenas suas opiniões ignorantes em relação às mulheres e homossexuais, mas também o seu julgamento errôneo.
O personagem do coronel e o desejo dos outros soldados para o amor que está fora de alcance, refletem as deficiências dos relacionamentos heteros em comparação a estabilidade e calor que são encontrados na relação de Yossi e Jagger. Além disso, o julgamento de Yossi prova ser melhor que o do coronel, sugerindo que, embora Yossi seja um desajuste no sistema heterossexista, ele pode superar aqueles que supostamente são seus superiores na hierarquia militar
O filme, portanto, inverte o equilíbrio de poder entre a homossexualidade e a heterossexualidade, sugerindo que a primeira é implicitamente superior a última. Esta luta pelo poder, no entanto, tem lugar dentro de um domínio patriarcal e adota a moral heterossexista.
A grande façanha de Yossi no filme é sua falsa tentativa em abafar sua sexualidade, a fim de passar por hetero. É Jagger que tenta romper seu silêncio auto-imposto, um ato pelo qual ele é morto. E é a exposição do seu cadáver que assegura a estrutura de poder existente.
A morte de Jagger e a discrição - que é uma parte imanente da parceria de Yossi e Jagger -, violam o romance dos soldados. No final, a estrutura militarista e homofóbica se mantém intacta, e até mesmo os pais enlutados de Jagger , na cena final, são mantidos cegos quanto a sexualidade do filho.
Eytan Fox & Gal Uchovsky
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O fato de apenas Yossi saber a música favorita de Jagger implica uma fratura (possivelmente reveladora) no romance escondido de ambos. Para selar esta ocultação sobre a verdadeira natureza de Jagger, Yaeli declara seu amor por ele, acrescentando que acredita que ele sentia o mesmo por ela, embora nunca tenha falado sobre isso. A mãe de Jagger fica então com a crença de que seu filho tinha uma namorada, convencida de que ele era "normal" nos os padrões da sociedade. Embora longe da verdade, sugere-se que os pais ficam emocionalmente melhor com este tipo de mentira.
Disfarçado em seus uniformes, sofrendo em silêncio até a morte de Jagger, os dois protagonistas provam que os homens gays podem ser parte da sociedade israelense enquanto aceitarem a ordem existente e manterem seu amor em segredo. O importância de "transplantar" um desejo proibido para o exército é prejudicada pelo entendimento de que eles devem se entregar sem lutar às normas heterossexista.
Yossi & Jagger
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O filme foi feito por um cineasta gay ativista, conhecido por incentivar famosos artistas israelenses a tornarem pública sua sexualidade, mas ele só mostra e reafirma como são as prevalentes normas heterossexistas, na medida em que elas foram internalizadas pelos próprios membros da comunidade gay.
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Yossi e Jagger (trailer legendado)
Yossi (trailer)
Time off (cenas do curta)
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