É difícil
descrever o que senti ao assistir “Elis a Musical”.
Por um lado testemunhei
um conjunto de talentos excepcionais unidos para apresentar um dos
melhores espetáculos que já vi. Por outro assisti a um
filme da minha vida embalado pelas canções
apresentadas.
Não teve como não me emocionar aos cântaros.
O resultado foi que saí do espetáculo zonzo, abobado, não conseguindo assimilar bem o que tinha acabado de vivenciar naquelas três horas no Casa Grande.
Voltei ao hotel e demorei a pegar no sono.
Não teve como não me emocionar aos cântaros.
O resultado foi que saí do espetáculo zonzo, abobado, não conseguindo assimilar bem o que tinha acabado de vivenciar naquelas três horas no Casa Grande.
Voltei ao hotel e demorei a pegar no sono.
O Musical :
A peça inicia
por volta do final da década de 50 com Elis (Laila Garin)
garota ainda em Porto Alegre.
Vemos sua “travada” em uma apresentação no programa “Clube do Guri”, mas, logo em seguida ela dá a volta por cima e manda ver, conquistando o sucesso na capital dos Pampas.
Vemos sua “travada” em uma apresentação no programa “Clube do Guri”, mas, logo em seguida ela dá a volta por cima e manda ver, conquistando o sucesso na capital dos Pampas.
Eu, como “gaúcho
natural”, estranhei o sotaque forçado dos atores (que acaba
ficando hilário), porém o inaceitável foi o
inaceitável (sic) “erro” de conjugar perfeitamente o
verbo na segunda pessoa, tipo “Tu vaiS, guria”, quando todo mundo
sabe que o gaúcho fala “Tu vaI, guria”. De qualquer modo o
que achei legal foi ouvir falar do Bairro IAPI e, é claro, da
minha querida Porto Alegre. Muito bom.
Mas, tudo bem.
Felizmente o “gauchês” é logo abandonado assim que
Elis é convidada por Carlos Imperial para ir ao RJ gravar alguns discos no “estilo Cely Campelo” (a sensação
musical dos jovens de então).
Neste formato
pré-programado para o sucesso, a garota grava três
discos (a peça fala só gravadora CBS, mas Elis grava
seu primeiro LP, “Viva a Brotolândia” pela Continental),
que resultam em nada.
Porém estes
“fracassos” não intimidam a guria e, na data (talvez
mentirosa) de 31 de Março de 1964 (data do golpe militar),
Elis chega com o pai, Romeu ao Rj para assinar um contrato de
gravação com a Philips.
Na cidade maravilhosa ela acaba conhecendo a noite do Beco das Garrafas, local
em Copacabana com várias boates (algumas tipo inferninho de má
reputação). Os espaços ali eram mínimos,
mas rolava muita criatividade e bom gosto musical.
Ali eles montaram o primeiro show de sucesso de Elis, porém as coisas aconteceram debaixo de mau tempo devido à personalidade, digamos, “forte” da cantora (reclamação sobre a espera para ensaios, suas faltas às apresentações – por estar fazendo shows em outros locais, etc).
Ronaldo Bôscoli
(Felipe Camargo) e Míéle (Caike Luna), famosos bambambâns na
noite carioca produziam e dirigiam shows em algumas das casas
noturnas do Beco.
Ali eles montaram o primeiro show de sucesso de Elis, porém as coisas aconteceram debaixo de mau tempo devido à personalidade, digamos, “forte” da cantora (reclamação sobre a espera para ensaios, suas faltas às apresentações – por estar fazendo shows em outros locais, etc).
No Beco, Elis conhece
Lennie Dale (Danilo Timm), um coreógrafo da Broadway que amava
o Brasil e que transforma sua expressão corporal.
Aqui acontece o primeiro grande número da noite com o Danilo dando um show com o clássico bossanovista “O pato”. O cara canta e dança pra caralho. O povo vem abaixo.
Aqui acontece o primeiro grande número da noite com o Danilo dando um show com o clássico bossanovista “O pato”. O cara canta e dança pra caralho. O povo vem abaixo.
Boscoli não
gostou das “mexidas” da cantora e foi reclamar com Miele. A
resposta de Miele é célebre : “Deixa, Bôscoli,
assim ela enterra a bossa nova de vez”
Atrás de caches
mais polpudos Elis “caga” para o Beco e parte para Sampa.
Bôscoli, puto, manda botar uma tarja preta sobre o nome da
estrela nos cartazes da entrada da boate em Copa, numa declaração de guerra à desafeta.
Salta para a
consagração nacional no “I Festival de Musica Popularda Excelsior” onde ela conquista o primeiro lugar defendendo, de
forma inesquecível “Arrastão”.
Icaro Silva (Jair Rodrigues) e Laila Garin (Elis) |
O pout-pourri de samba apresentado por Laila e Ícaro é matador.
O clima esquenta (no
bom sentido) com o Bôscoli e logo eles estão casados,
num affair bem “entre tapas e beijos”.
Elis parte para Paris,
onde se apresenta com Pierre Barouh (Samba Saravah) e no Olimpía.
Na volta para o Brasil descobre as puladas de cerca do marido galinha e, numa performance "tô lôca", agarra a coleção de long plays do Frank Sinatra do varão do lar, e promove uma festa tipo "disco voador".
Porém eles logo voltam aos beijinhos numa felícidade bélica.
Na volta para o Brasil descobre as puladas de cerca do marido galinha e, numa performance "tô lôca", agarra a coleção de long plays do Frank Sinatra do varão do lar, e promove uma festa tipo "disco voador".
Porém eles logo voltam aos beijinhos numa felícidade bélica.
No lado público, não fica de fora
a “mancha política” na trajetória da diva, quando, em plena ditadura militar, foi obrigada
a cantar na famigerada Olimpíadas do Exército.
Isto lhe causou um patrulhamento do combativo "O Pasquim". Henfil (Peter Boos), numa charge histórica, a “enterrou” no cemitério dos Mortos-Vivos do Cabôco Mamadô, lugar para onde ele mandava todos aqueles que, na sua opinião, colaboravam com a ditadura.
Isto lhe causou um patrulhamento do combativo "O Pasquim". Henfil (Peter Boos), numa charge histórica, a “enterrou” no cemitério dos Mortos-Vivos do Cabôco Mamadô, lugar para onde ele mandava todos aqueles que, na sua opinião, colaboravam com a ditadura.
Inicio da Charge - Os quadrinhos avançam até Elis reencarnar como Chevalier num show para os nazistas em 45 |
Na tranquilidade do lar, discussão vai, discussão vem, e fica claro que o os anos felizes definitivamente vão por ralo abaixo, situação onde ocorre o momento mais “estranho” do espetáculo.
Senão vejamos :
Abandonada, Laila começa a cantar, de forma bem trágica, “Atrás da Porta”, que todo mundo sabe ser um hino à dor de corno. Porém, durante a música, ela vai se afastando fisicamente de Bôscoli e nas frases finais que repetem .”...eu ainda sou tua...”, ela já está meio de arreganho com o Cesar Camargo Mariano (Claudio Lins).
Achei ... “diferente”.
O segundo começa
grandioso com “Nada Será Como Antes”, “Canção da América”, “ Fé Cega, Faca Amolada” e “Maria Maria”
O que vemos a
seguir são principalmente as inquietudes artísticas de
Elis através da sua busca de formas para trabalhar e reinventar sua arte.
Assim, logo estamos em Los Angeles onde aconteceu um dos encontros mais brilhantes da música universal e que resultou no clássico “Elis e Tom”.
A número com “Aguas de Março” é simplesmente assustador e quem está no teatro é transfigurado pela magia da cena.
Mas, como a coisa é pra acabar mesmo com todos os pagantes, ao apresentar o conceito e uma passagem do “Falso Brilhante”, o torpedo “Como nossos pais” não deixa pedra sobre pedra.
Já, para ilustrar o “Transversal do Tempo” - o espetáculo mais político da Elis, que expressava a idéia de “uma sinaleira que nunca abre”, montado corajosamente ainda durante a ditadura, - temos pela frente “Querelas do Brasil” e “Deus lhe pague”. Algo tipo “sem comentários”
Laila / Elis |
A reaproximação
dela com Henfil, como não poderia deixar de ser, se dá
através de “O bêbado e a equilibrista” - o Hino da
Anistia - numa cena “para chorar”, o que inevitavelmente ocorre
no palco e na platéia.
A poderosa “As aparências enganam” emendada com a bela letra de “ O trem azul”
mostra o final do casamento com Mariano. E o Claudio Lins prova que
não é apenas um corpinho bonito, soltando a voz e
destruindo corações.
O final é
catártico com uma colagem de falas da Elis apresentadas em
forma de depoimento diretamente à platéia, que é
seguida pela absurda “Aos nossos filhos”.
Sem mentira, o cara ao
meu lado perdeu o controle de forma nada discreta e, sim, ...
s-o-l-u-ç-a-v-a ... (que horror).
Eu, na minha fleuma britânica, deixei escorrer apenas uma lágrima elegante. Mentira, borrei o rímel todo ( e dei umas fungadas discretas, espero).
Eu, na minha fleuma britânica, deixei escorrer apenas uma lágrima elegante. Mentira, borrei o rímel todo ( e dei umas fungadas discretas, espero).
“Redescobrir” encerra a noite num clima apoteótico, e isto me lembrou que uma das acusações que o Saudades do Brasil” sofreu é de que era “muito Broadway” - sendo que o espetáculo encerrava exatamente com esta música.
Então vejam só que o críticado “final Broadway” do “Saudades” é retomado, bem Broadway mesmo, no final de “Elis a Musical”. Que ironia...
E o povo vai na onda e delira em ovação
total
Fim.
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... pausa...
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De volta ao início
Fim.
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... pausa...
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De volta ao início
Voltando ao meu estado
catatônico inicial, percebi que, num nivel pessoal, o que
diferencia “Elis a Musical” de “Piaf” (por exemplo) é
a contemporaneidade dos presentes no teatro em relação
ao que está sendo apresentado no palco.
Posso ver uma peça sobre Piaf, Maria Callas, Billie Hollyday, etc, e entender, digamos, os momentos históricos de cada história (sic), e assim fruir a noite.
Posso até ter algumas “músicas antigas” como referência da minha própria história; mas certamente não tenho a riqueza de referências de quem viveu (n)as épocas apresentadas
Já no caso de “Elis”, “Tim Maia” e outros, o que ocorre é uma relação da minha vida com as tais “músicas antigas”. É impossível ouvir as canções e não viajar no tempo.
Posso ver uma peça sobre Piaf, Maria Callas, Billie Hollyday, etc, e entender, digamos, os momentos históricos de cada história (sic), e assim fruir a noite.
Posso até ter algumas “músicas antigas” como referência da minha própria história; mas certamente não tenho a riqueza de referências de quem viveu (n)as épocas apresentadas
Já no caso de “Elis”, “Tim Maia” e outros, o que ocorre é uma relação da minha vida com as tais “músicas antigas”. É impossível ouvir as canções e não viajar no tempo.
Isto faz muita
diferença e é pavorosamente emocionante.
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Elenco :
Seria maldade dizer que
os melhores são fulano, sicrano e beltrano. Maldade e mentira,
pois todos estão ótimos, mesmo em intervenções,
digamos, minúsculas. Por exemplo, a garota que faz a Marilia
Gabriela com apenas três frases faz o teatro explodir em
gargalhadas, e o rapaz que faz o Paulo Francis tembém (infelizmente não
sei o nome deles). Os papéis maiores estão em mãos
de talentos irretocáveis, com destaque óbvio para
Laila Garin.
Laila Garin :
Laila Garin |
Quando está em cena é impossível deixar de segui-la. Percebe-se que todo seu ferramental (corpo, voz, gestual) está concentrado para dar carne à personagem.
E a linda não se traveste de Elis, não a imita, e sim recria-a, inventa-a e reinventa-a com coragem e humildade ímpares.
Nas primeiras canções fiquei com
mêdo tipo “.. será que ela alcança?”. E não é que a danada alcança mesmo?
Assim, mesmo sem estarmos ouvindo a voz original da imortal, chega a ser sinistro, pois logo estamos vendo Elis no palco.(..mêda total...).
Elis Vive :
Na década de 80,
me lembro que Porto Alegre ficou pichada de “Elis Vive” durante
algum tempo após sua morte. Aquilo de certa forma preenchia o
vazio deixado em seus fâs. Depois as pichações
pararam e muito foi esquecido.
Agora parece que estamos numa fase de “retomada” e mais coisas vêm por aí para saudar a memória de uma das melhores cantoras do mundo. “Elis, a Musical” certamente é parte deste momento e definitivamente merece todos os elogios que vêm recebendo.
Agora parece que estamos numa fase de “retomada” e mais coisas vêm por aí para saudar a memória de uma das melhores cantoras do mundo. “Elis, a Musical” certamente é parte deste momento e definitivamente merece todos os elogios que vêm recebendo.
Só espero que a
turnê nacional, prometida para o segundo semestre de 2014,
traga esta maravilha para Porto Alegre.
O bacana é que também está sendo prevista uma transmissão do musical via internet. Veja aqui.
O bacana é que também está sendo prevista uma transmissão do musical via internet. Veja aqui.
Alguns Vídeos :
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